PADRE LUIZ CARLOS DE OLIVEIRA CSsR |
O
desejo de Deus
Um
dos aspectos que mais nos encanta na pessoa de Jesus é sua densidade humana,
que faz perceber o divino. Como Jesus deixava resplandecer a beleza humana de
seu coração divino! A liturgia de hoje nos oferece dois textos que refletem
esse pensamento. Na leitura de Gênesis 18,1-10 encontramos a visita dos três
anjos a Abraão. Ele os recebe com toda a gentileza e os serve. Ao se despedirem
prometem a Sara um filho. É o filho da promessa. Jesus, como nos narra Lucas no
evangelho (10,38-42), é recebido na casa de Marta e Maria, irmãs de Lázaro.
Marta se preocupa com a faina da casa para acolher bem Jesus. Maria, assentada
diante de Jesus, escuta Sua palavra. Abraão se abre totalmente ao acolhimento
dos viajantes. Maria se faz discípula fiel que ouve e acolhe no silêncio Jesus
e sua Palavra. Jesus, aproveita-se de qualquer oportunidade para anunciar.
Marta valoriza uma hospitalidade exterior. Maria a interior. Jesus diz a Marta
que ela deve parar um pouco e dar valor ao mais importante que é Ele e Sua
palavra: “Marta, Marta! Tu te preocupas e andas agitada por muitas coisas.
Porém uma só coisa é necessária. Maria escolheu a melhor parte e esta na lhe
será tirada” (41-42). Jesus não desdenha a atividade necessária da vida, mas
coloca as coisas no lugar. Atividade sim, mas não só. Ensina-nos, com esse
texto, dar valor àquilo que temos dentro de nós: saciar o desejo que temos de Deus.
Nas bem-aventuranças Jesus ensina que “os puros de coração verão a Deus”. O
desejo de ver a Deus é inato no coração. Essa pureza não é ascética, mas
transparência que deixa enxergar Deus. Abraão, inconsciente, vê Deus na sua
dedicação de hospitalidade. Maria deseja ocupar-se somente Dele. Dessa atitude
nasce a força da atividade humana.
Mística,
natural da vida
Acolher em casa, no sentido do
verbo, significa também acolher a Palavra de Deus. As atitudes humanas de
acolhimento correspondem ao acolhimento de Deus, como fez Abraão, como fez
Maria. O que esse evangelho nos convida a fazer é criar uma mística de vida que
seja um modo natural de viver. Mística não significa estar fora da realidade,
mas viver a realidade com realidade completa, isto é, com toda a densidade de
vida que ela possui. Ser místico não é ser tonto, é ser completo. As atividades
não impedem de estar com Deus e fazer Dele o sentido de tudo o que vivemos.
Esse sentido é vê-lo presente e atuante naquilo que somos e fazemos. Marta estava
diante de Jesus e não o via como Maria. A vida cristã é envolta de atividade e
contemplação. Se dermos o primado ao mais importante, estamos armazenando a
força da Palavra para dar palavra de vida às atividades. Deus quer vir para
nosso cotidiano, como no Paraíso, onde conversava com Adão na brisa da tardinha
(Gn 3,8).
Presença
de Cristo em vós.
Ao
realizar esse projeto, tornamos grande nossa união a Cristo. O desejo de Deus
faz-nos discípulos, como Maria, que está sempre à escuta. Podemos criar essa
mentalidade de silenciar o interior e poder ter sempre os olhos fixos em Jesus,
como nos exorta a carta aos Hebreus (Hb 12,24). Paulo fala do mistério revelado
aos santos (26). As dificuldades virão, pois “completamos em nosso o corpo o
que falta às tribulações de Cristo, em solidariedade com seu corpo, isto é, a
Igreja” (Cl 1,24). Os homens e mulheres de Deus viveram assim: silêncio,
acolhimento, desejo de Deus, atividade e presença de Cristo. Por isso foram
atuantes e deixaram um caminho.
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