A espiritualidade passa por muitos caminhos. Um deles é a piedade popular. O Documento de Aparecida (nº 7) reconhece que ela é uma das riquezas de nossos povos, é um tesouro precioso da Igreja católica da América Latina (258), que deve ser catequizada (300). O que é a piedade popular? É a maneira de o povo viver sua fé, seguindo tradições espirituais que vêm de séculos. Na Idade Média, a liturgia se afastou do povo e se tornou um assunto do clero. Era feita em latim, que não era mais a língua do povo. Este, distante, criou sua forma de se relacionar com Deus partindo, sobretudo, dos aspectos humanos da vida de Cristo, como Nascimento, Paixão, Eucaristia, dores de Maria, devoções aos santos, relíquias, santuários e devoções, como o terço, a via-sacra. Salienta-se neste tempo a humanidade de Cristo. A própria estrutura eclesial assumiu a piedade popular. Essa piedade sustentou e santificou o povo por séculos. E ainda é importante. Com o Vaticano II houve um arrefecimento brusco que prejudicou pelo fato de ter excluído o povo. Foram tiradas devoções e não foram substituídas de modo adequado. Como é uma cultura, não se muda de um dia para o outro. As tentativas dos movimentos, como carismáticos, devoções vindas de outros países que trouxeram benefícios, mas não para o povo em geral. Este ficou perdido e buscou outros meios e outros cultos. A tentativa era fazer uma renovação geral. Isso precisa de catequese, liturgia bem adaptada à condição do povo. A teologia da libertação trouxe excelente contribuição, mas foi sufocada e não resolveu a questão da religiosidade popular. A renovação litúrgica, distante do povo, não conseguiu colher sua alma e com ela enriquecer a celebração do mistério. Continuamos com o pé em duas canoas.
Uma escola de fé
A religiosidade da piedade popular é uma escola de fé, pois conduz o fiel à vida de Cristo, dos santos e às práticas de piedade. Como escola de fé estimula a vida cristã, mas tem um risco: desliga a fé da vida. A devoção, se não compromete a vida com o sentido do evangelho, torna-se frágil. Esse é um dos perigos da religiosidade popular. Fica no exterior. Por isso, a Igreja insiste na evangelização da religiosidade popular (41,300,549). É boa, mas precisa aprofundar os conteúdos e comprometer a vida. No momento atual há uma volta à devoção aos santos, mas, infelizmente, na busca dos milagres e não na procura de viver a vida cristã. Os santos são intercessores, modelos e estímulos a viver o evangelho. O risco da devoção sem compromisso com a vida é ficar na emoção, no exterior da representação. A religiosidade e piedade popular ajudam na medida em que ajudam nossa conversão.
Caminhos de espiritualidade
A piedade popular tem um elemento muito importante para a compreensão a fé: Tira a fé do puro racionalismo onde damos valor só ao conhecimento da doutrina e nos orienta a infundir os ensinamentos no coração. Se por um lado não é boa uma devoção que não compromete a vida, por outro, a pura doutrina sem vida e sentimento, não edifica. Está faltando essa mútua ajuda. Ao venerarmos os santos e participarmos dos mistérios da vida de Cristo em sua visão mais sensível, precisamos buscar confrontar nossa vida com eles e tomar decisões de conversão. Aí sim, a piedade popular enriquece a Igreja. Não basta citar textos da bíblia, é preciso encarná-la na vida. Louvamos a Deus pelo povo que manteve sua fé, mesmo sem a presença da Igreja. A Igreja é chamada a conhecer a alma do povo e assim dispensar os mistérios sagrados e os ensinamentos da fé de modo compreensível. A base desta atitude educadora é o carinhoso acolhimento do povo, linguagem que ele entende bem.
ARTIGO REDIGIDO E PUBLICADO
EM JUNHO DE 2009
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