sexta-feira, 23 de agosto de 2019

REFLETINDO A PALAVRA - “Solidão que não pesa”

PADRE LUIZ CARLOS DE OLIVEIRA
REDENTORISTA
51 ANOS CONSAGRADO
44 ANOS SACERDOTE
1903. Em busca de um deserto 
Sempre houve na Igreja e, em outras culturas, a busca pelo deserto. No início do cristianismo, o cristão mais autêntico era aquele que dava a vida por Cristo no martírio. Com a diminuição dos martírios, surgiu outro fenômeno muito forte que ainda tem vigor: a busca da solidão no deserto. Foi uma verdadeira maré de homens e mulheres buscando a vida solitária para o encontro com Deus e a vitória sobre o mal. Imitavam Jesus que foi ao deserto e venceu a tentação. Diante da crise de mundanismo que se vivia no império romano, procuravam a simplicidade. Faziam uma fuga do vazio para a plenitude na busca do único necessário. Não se tratava de fugir da realidade, mas ser útil à realidade espiritual do homem. Foram pessoas de vida muito longa. Com S. Basílio no Oriente, S. Pacômio no Egito e S. Bento no Ocidente, perto de Roma, surgiu um novo modo de vida solitária. Com o tempo criou-se a necessidade de viverem em comunidade para refazerem em si a vida da comunidade primitiva, sem perder o direito à solidão, como S. Afonso de Liguori fez indo para Scala para fundar a Congregação Redentorista. Essa solidão acontece dentro do indivíduo que quer ser dono de si mesmo e construir-se livremente sem deixar que o vazio seja uma condição de vida. O esvaziar-se é o caminho para capacidade de escuta. Por isso encontramos no deserto a grande missão dos “mestres” “pais espirituais” que introduziam nessa busca de si mesmo para o autoconhecimento e densidade do vazio interior. Procura-se ser o homem à estatura de Cristo (Efésios 4,13). O povo judeu viveu quarenta anos no deserto para amadurecer sua capacidade de entrar na terra prometida. Jesus fez quarenta dias de deserto. Saiu maduro para a missão. 
1904. Vivendo só 
Não estou procurando fazer propaganda da vida monacal. Quero procurar entender meditando sobre uma situação que vivemos na sociedade atual. Antes se fugia para o deserto para sair do vazio da sociedade para encontrar o sentido na solidão. Agora encontramos uma sociedade vazia que procura preencher o sentido com tantas novidades e agitações. Mesmo no meio dessa massa, o indivíduo vive só. Essa solidão aumenta quando retorna para casa e se está só. Vemos a situação das famílias desagregadas complicando mais ainda esse quadro. Dois males a evitar: viver só no meio da multidão e viver sozinho com a multidão dentro de si. A pessoa está ficando muito só. As famílias são pequenas, se dissolvem com facilidade, as visitas caíram de moda, vizinhos não se conhecem mais etc... Pior a situação dos que ficam idosos e são solteiros ou sozinhos. É um deserto compulsório. “A solidão me dói!”. Mesmo os que vivem com alguém, provam ser solitários dentro de uma casa com mais pessoas, ou dentro de um convento com confrades. 
1905.Uma pastoral a se fazer 
É o momento de pensarmos numa pastoral para os solitários que não se enquadram num programa de terceira ou a melhor idade. Ouvi de uma experiência feita de se celebrar juntos o Natal reunindo essas pessoas. Essa pastoral deve conduzir a pessoa a assumir uma atitude eremítica – viver só, mas com plenitude. É uma volta interior ao deserto e ali encontrar Deus. É um desafio. Com os meios de comunicação à nossa disposição podemos criar a comunidade virtual dos que procuram Deus na solidão. As noite longas, como dizia Pe. Vitor Coelho, servo de Deus, são o momento de falar com o Pai. Perdemos muito tempo com inutilidades e até com perversões, em lugar aproveitá-lo para a vida que vale. Quem sabe seja o momento de procurar retomar o sentido do deserto na condição atual.

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