segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

O HOMEM ABUTRE

PADRE CLÓVIS DE JESUS
BOVO CSsR
O povo apelidou aquele homem com o nome asqueroso de “abutre” ave de rapina que devora tudo o que encontra. Era um homem alto e corpulento, de semblante sombrio e perverso. Passava o dia percorrendo a cavalo suas terras, com a espingarda a tiracolo e as botas fincadas nos estribos. Oprimidos pelas ameaças, os pequenos proprietários iam cedendo suas terras por preços irrisórios. Ainda obrigava-os a trabalhar nas terras roubadas, a troco de salários de fome. Naquele tempo não havia ainda sindicatos rurais onde pudessem recorrer. Pedro era um dos últimos confrontantes que resistia às pressões do “abutre”. Não entregaria nem por nada seu pedaço de chão, conseguido com muito suor. Passando por ele, quando capinava as plantas, o homem abutre ameaçou:
- Resolveu vender-me a terra? Resolva logo para não ficar pior para você. 
Pedro voltou revoltado para casa. A esposa estranhou: 
- Está doente, marido? 
- Minha doença é a raiva. Ainda vou acabar matando aquele homem. 
Passaram-se algumas semanas. O arroz começou a amarelar. A esposa o animava a confiar mais em Deus do que nos homens. Numa noite Pedro acordou sobressaltado. Um grande clarão saía da sua plantação. Estava pegando fogo. Foi difícil acalmar o marido, que tinha até pegado a espingarda para acabar com o abutre, autor do incêndio criminoso. Dez anos se foram. Tiveram que mudar-se para uma região mais tranqüila. Num dia de Finados ele voltou para aquele povoado com a esposa e os filhos a fim de visitar os parentes sepultados. Detiveram-se diante de um túmulo. Pedro apontou para a inscrição tumular. Lá estava sepultado o maior inimigo da sua vida. Ficaram sabendo detalhes da sua morte. Um dia percorrendo suas terras a cavalo, a espingarda disparou, e a bala atingiu o cavalo de raspão. Ele se assustou e desandou a correr, atirando o cavaleiro numa barroca. Dizem que morreu no hospital, arrependido. No seu túmulo mandou escrever: 
-“Fui mau e malvado. Peço perdão a Deus e a vocês”. 
Pai, mãe e filhos fizeram uma prece pelo seu perseguidor e depositaram um ramalhete de flores sobre o túmulo Era o gesto do perdão e da reconciliação.

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