segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Isabel, a Católica, rainha que empreendeu uma cruzada – 26 de novembro

Figura feminina extraordinária a muitos títulos, essa soberana exerceu papel decisivo na História da Espanha e de toda a Cristandade por seu espírito de cruzada contra o poder muçulmano da época José Maria dos Santos Muito foi escrito sobre esta soberana cujo processo de canonização está em andamento. Seguem algumas pinceladas de sua extraordinária existência, ressaltando do seu aspecto guerreiro e espírito de cruzada, o que é possível transmitir num simples artigo. Filha de João II, Rei de Castela, e sua segunda esposa, nasceu Isabel a 22 de abril de 1451 na pequena cidade de Madrigal. Aquela que seria a última mulher cruzada descendia, tanto pelo lado paterno quanto pelo materno, de dois reis santos e cruzados: São Luís IX, da França, e seu primo São Fernando III, de Castela. Falecendo o pai quando sua idade era pouco mais de três anos, foi educada piedosamente pela mãe, juntamente com seu irmão menor Afonso. “Bordava telas e casulas, costurava roupas para os pobres, aprendia a fiar como as mulheres do povo. Tecia sedas, urdia e confeccionava tapetes com assombrosa habilidade”. (1) Aos 11 anos foi levada com Afonso por Henrique IV, seu meio-irmão, para a corte castelhana, considerada então a mais corrompida da Europa. 
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Na corte castelhana, dois partidos em disputa 
Na corte castelhana, “a princesinha estudava música, pintura, poesia, costura e gramática. Cada dia passava muito tempo em oração pedindo a Deus que os guardasse, a ela e a Afonso, livres de todo pecado; e especialmente invocava a Bem-aventurada Virgem, São João Evangelista e o apóstolo São Tiago, patrono de Castela”. (2) Pela fraqueza dos reis castelhanos, “nesse período [os nobres] tinham chegado ao ponto de despojar completamente o trono de sua autoridade. Aproveitavam-se da incrível imbecilidade de Henrique IV e das escandalosas relações entre Joana de Portugal, sua segunda mulher, e seu favorito Beltran de la Cueva”, (3) a quem atribuíam a paternidade da infanta Joana, por isso cognominada la Beltraneja. Com a chegada dos jovens príncipes, formaram-se logo na corte dois partidos: um que defendia a legitimidade destes ao trono, e outro que defendia a da Beltraneja. O primeiro partido tornou-se tão poderoso, que obteve do fraco rei que reconhecesse Afonso e Isabel como seus legítimos herdeiros. Falecendo o príncipe Afonso, o partido de Isabel quis aclamá-la rainha no lugar de Henrique IV. “Nessa ocasião, Isabel deu uma das primeiras provas de suas grandes qualidades, recusando a coroa usurpada que lhe era oferecida, e declarando que nunca, enquanto seu irmão vivesse, aceitaria ela o título de rainha”. (4) Aos 18 anos, Isabel casou-se secretamente com o herdeiro da coroa de Aragão, o príncipe D. Fernando, para evitar as tratativas que seu irmão fazia para casá-la com outro pretendente.  
Assume as rédeas do governo e reconstrói o país 
Isabel assumiu o governo aos 23 anos, à morte de Henrique IV. Com sua energia, e acompanhada de seu marido Fernando, foi obtendo a adesão de cada cidade para sua causa. Mas o Rei de Portugal, Afonso V, querendo assenhorear-se de Castela, entrou no país para casar-se com a Beltraneja, a qual, afirmava ele, era a legítima herdeira do trono. Vários potentados castelhanos tomaram seu partido, aliando-se a ele. A alternativa para Isabel era ceder, ou então guerrear. E ela não cedia num ponto em que julgava estar inteiramente com a razão. Assim, apesar de estar esperando um segundo filho, pôs a cota de malhas e, a cavalo, foi recrutando gente em todas as suas cidades, enquanto Fernando fazia o mesmo em Aragão. Habilíssimo general e grande estrategista, Fernando obteve retumbante vitória sobre o soberano português, consolidando assim Isabel no trono. Triste foi a herança que recebeu Isabel de seu fraco e imoral meio-irmão. “As indústrias quebravam, a moeda andava escassa, centenas de cidades desafiavam sua autoridade sob o mando de prefeitos que se criam reis delas, o povo morria de fome e de epidemias. A Igreja necessitava de reforma, o governo existia só de nome, e por todas as partes os camponeses estavam oprimidos por bandos de ladrões”. (5) Os jovens soberanos entregaram-se com energia à tarefa de reconstruir o país. Começaram a reprimir severamente os abusos e aplicar a justiça contra quem quer que fosse. Fizeram reviver, para isso, a Santa Irmandade, força de voluntários que servia de polícia local, com jurisdição sobre assassinatos, atos de violência, rapina, atentados a mulheres e desobediência às leis e aos magistrados. Isabel obteve do Papa a instauração da Santa Inquisição em Castela para pôr fim aos abusos, na esfera religiosa, principalmente de cristãos-novos (judeus convertidos), muitos dos quais tinham fé duvidosa e utilizavam a usura para pressionar os cristãos. Isabel era muito ciosa de sua autoridade como rainha. Por isso, em 1475 firmou com seu esposo o acordo denominado Concórdia de Segóvia, pelo qual recebeu o título de Rainha e proprietária de Castela, e seu esposo o de rei consorte. “Desde esse momento os esposos formam um bloco impossível de dividir, e com essa firmeza podem fazer frente ao estalido da guerra”. (6)  
A cruzada contra os infiéis maometanos 
Um dos maiores empenhos que Isabel teve em seu reinado foi mover a guerra santa contra o invasor muçulmano. Para esse empreendimento, obteve do Papa as mesmas indulgências de Cruzada concedidas aos que iam lutar na Terra Santa, tendo o Sumo Pontífice lhe enviado uma cruz de prata para ir à frente de seus exércitos.
Nas várias campanhas que encetou, e sobretudo na reconquista de Granada, Isabel arrebatava seus soldados por sua energia sobre-humana, senso do dever e espírito sobrenatural. Estes “criam que ela era uma santa. Como Santa Joana d’Arc, sempre lhes recomendava viver honestamente e falar bem. Não havia nem blasfêmias nem obscenidades no acampamento onde ela se achava, e viam-se curtidos soldados ajoelhar-se para rezar, enquanto se celebrava a missa ao ar livre por ordem da piedosa rainha”. (7) A presença da soberana era para os guerreiros como uma garantia de vitória, pois lhes inspirava valor e confiança. Até os mouros admiravam a grande rainha, cantando sua bondade e beleza em suas canções, apesar de a temerem como inimiga.
Enquanto Fernando, um dos melhores guerreiros de sua época, comandava o exército, a rainha cuidava de toda a retaguarda, como recrutamento de reforços, envio de alimentos e munições, bem como projetava os hospitais — foi ela quem instituiu o primeiro hospital militar da História, e suas enfermeiras precederam as da Cruz Vermelha em mais de trezentos anos. Cavalgava de um lugar a outro, indo mesmo aos acampamentos revestida de leve armadura de aço, para elevar o moral dos soldados. Mas essa rainha guerreira fazia questão de ela mesma costurar a roupa de seu marido, nunca usando o monarca outras senão as confeccionadas pelas hábeis mãos de Isabel ou de suas filhas. 
Título glorioso de “Reis Católicos” 
Um fato mostra a têmpera dessa rainha. No cerco de Granada, uma vela mal colocada ateou fogo na tenda ao lado da rainha, e desta propagou-se para todo o acampamento, que foi tomado pelas chamas. Os mouros, das muralhas, cantavam vitória. Mas a enérgica soberana, para mostrar sua determinação de conquistar a cidade, mandou edificar novo acampamento de pedra, surgindo assim uma verdadeira cidade à qual deu o nome de Santa Fé. Foi de lá que partiram as investidas contra Granada, obtendo-se sua capitulação. O Papa Alexandre VI concedeu ao real casal, por seus serviços em prol da Cristandade, o título de Reis Católicos, em harmonia com o de Rei Cristianíssimo, concedido anteriormente ao monarca francês. A política matrimonial que seguiram os Reis Católicos teve como intuito isolar a França, sua grande rival na época. Mas não tiveram felicidade com seus filhos. A primogênita, também chamada Isabel, casou-se com o jovem príncipe português Afonso e, ao enviuvar precocemente, contraiu matrimônio com o seu herdeiro Dom Manuel, o Venturoso. O príncipe João casar-se-ia com Margarida de Áustria, filha do Imperador Maximiliano I, mas morreria jovem. Joana, que entrará para a História como Joana a Louca, contraiu matrimônio com Felipe de Áustria, o Formoso, e tornou-se herdeira do trono que passou para seu filho, o futuro Carlos V. Maria casa-se com seu cunhado, o viúvo Dom Manuel, e Catarina será a desafortunada esposa do lúbrico Henrique VIII, da Inglaterra. “O bom governo dos soberanos católicos levou a prosperidade da Espanha ao seu apogeu e inaugurou a Idade de Ouro do país”. (8) Três meses após a conquista de Granada, Isabel assinou uma ordem de expulsão dos judeus de seus territórios; e favoreceu a empresa de Cristóvão Colombo, que descobriria assim a América. A morte desta grande rainha foi muito lamentada pelos seus contemporâneos. Um deles deixou este depoimento: “O mundo perdeu seu adorno mais nobre; uma perda que deve chorar não somente a Espanha, que ela já não levará mais no caminho da glória, mas todas as nações da Cristandade, porque ela era o espelho de todas as virtudes, o amparo do inocente e o sabre vingador do culpado. Não conheço ninguém de seu sexo, nos tempos antigos nem nos modernos, que, a meu juízo, possa equiparar-se com esta mulher incomparável”. (9)
 A Soberana no leito de morte dita seu testamento (Rosales)
E-mail do autor: josemaria@catolicismo.com.br ________ Notas: 1. Luís Amador Sanchez, Isabel, a Católica, tradução de Mario Donato, Empresa Gráfica O Cruzeiro S. A., Rio de Janeiro, 1945, p. 55. 2. William Thomas Walsh, Isabel de España, tradução castelhana de Alberto de Mestas, Cultura Española, 1938, p. 49. 3. Ramón Ruiz Amado, DO, The Catholic Encyclopedia, Vol. VIII, transcrito por WGKofron, copyright © 1910 de Robert Appleton Company, online edition copyright © 1999 by Kevin Knight. 4. Id. ibid. 5. William Thomas Walsh, op.cit., p. 171. 6. (Site: www.artehistoria.com, Protagonistas de la História, Isabel la Católica.) 7. Walsh, op.cit., p. 160. 8. The Catholic Encyclopedia, online edition. 9. Carta de Pedro Mártir, um dos secretários da rainha, comunicando a morte de Isabel ao Arcebispo Talavera, in William Thomas Walsh, Isabel de España, p. 599. (Fonte: Catolicismo, julho de 2004)


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