Evangelho segundo São Lucas 10,17-24.
Naquele tempo, os setenta e dois discípulos voltaram cheios de alegria, dizendo: «Senhor, até os demónios nos obedeciam em teu nome».
Jesus respondeu-lhes: «Eu via Satanás cair do céu como um relâmpago.
Dei-vos o poder de pisar serpentes e escorpiões e dominar toda a força do inimigo; nada poderá causar-vos dano.
Contudo, não vos alegreis porque os espíritos vos obedecem; alegrai-vos antes porque os vossos nomes estão escritos no Céu».
Naquele momento, Jesus exultou de alegria pela ação do Espírito Santo e disse: «Eu Te bendigo, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas verdades aos sábios e aos inteligentes e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado.
Tudo Me foi entregue por meu Pai; e ninguém sabe o que é o Filho senão o Pai, nem o que é o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar».
Voltando-Se depois para os discípulos, disse-lhes: «Felizes os olhos que veem o que estais a ver,
porque Eu vos digo que muitos profetas e reis quiseram ver o que vós vedes e não viram e ouvir o que vós ouvis e não ouviram».
Tradução litúrgica da Bíblia
São John Henry Newman
(1801-1890)teólogo,
fundador do Oratório em Inglaterra
«Meditações e Devoções»: III parte, 2, 2
«Muitos profetas e reis quiseram
ver o que vós vedes»
Poder-se-á dizer que a partilha profunda dos sentimentos é uma lei eterna, porque tem significado, ou melhor, tem cumprimento, de forma primordial, no amor recíproco e indizível da Trindade. Deus, infinitamente uno, foi também sempre três pessoas. Desde sempre, Deus exulta no Filho e no Espírito, e Eles nele. Quando o Filho Se fez carne, viveu durante trinta anos com Maria e José, formando assim uma imagem da Trindade na terra. Mas convinha que Aquele que havia de ser o verdadeiro Sumo-Sacerdote, e de exercer esse ministério para toda a raça humana, estivesse livre de laços e de sentimentos, tal como se dissera antigamente que Melquisedeque não tinha pai nem mãe (Heb 7,3). Abandonar a mãe, gesto que Ele torna plenamente significativo em Caná (Jo 2,4), era portanto o primeiro passo solene necessário ao cumprimento da salvação do mundo. Jesus renunciou não só a Maria e a José, mas também aos amigos secretos. Quando chegou o seu tempo, teve de renunciar a todos eles.
Mas podemos supor que estava em comunhão com os santos patriarcas que haviam preparado e profetizado a sua vinda. Numa ocasião solene, vimo-lo falar durante toda a noite com Moisés e Elias sobre a Paixão. Que visão, que pensamentos nos são então abertos acerca da pessoa de Jesus, de quem tão pouco sabemos! Quando Ele passava noites inteiras em oração, quem melhor poderia apoiar o Senhor e dar-Lhe força do que essa «multidão admirável» de profetas de quem Ele era o modelo e o cumprimento? Ele podia pois falar com Abraão, que exultara pensando que tinha visto o seu dia (Jo 8,56), com Moisés, com David e Jeremias, que tão particularmente O tinham prefigurado, com os que mais tinham falado com Ele, como Isaías e Daniel. Encontrava nestes um fundo de grande proximidade. Quando foi para Jerusalém, para o sofrimento último, todos os santos patriarcas da antiga aliança, cujos sacrifícios prefiguravam o seu, vieram invisivelmente ao seu encontro.
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