Ali foi guilhotinado durante a terrível Revolução francesa.
Antes que lhe cortem a cabeça, disse ainda:
“Introibo ad altare Dei”.
Foi numa família muito cristã que nasceu o nosso Beato: era o décimo sexto filho destes pais piedosos de Angers; o seu pai, René, era tecelão e a sua mulher era Claude La Croix.
Uma família tão bela não está isenta de provações: no próprio dia do seu nascimento, 19 de Dezembro de 1847, a anterior morria com pouco mais de um ano; outro já tinha morrido oito anos antes, com poucos dias; dois meses após o seu nascimento, em Fevereiro de 1848, uma das suas irmãs morreu aos doze anos de idade, e logo outra irmã morreu também, com cinco anos e meio. A maior prova, porém, foi outra morte: a do pai desta série de crianças, que morreu em 1756, com apenas cinquenta anos de idade, seguido no mesmo ano por outra das suas filhas, com apenas vinte e três anos de idade; apenas o seu adolescente de catorze anos, Pedro, permaneceu em casa para trabalhar.
Esta família viveu no entanto um momento muito feliz: o filho mais velho, René, foi ordenado sacerdote quando Noël tinha apenas seis anos, e terminou os seus dias como capelão na catedral de Angers, em 1782. Foi ele quem ensinou ao seu irmão mais novo os primeiros rudimentos do latim, assim que expressou o seu desejo de se tornar padre. O colégio onde Noël fez então todos os seus estudos é a actual Câmara Municipal de Angers. Ele fará a sua Filosofia no seminário que é agora a Escola de Belas Artes; enquanto a capela desta casa se tornará o templo protestante.
Como bom aluno, Noël não pôde, contudo, conquistar o mestrado em Artes, tendo perdido um mês nos seus estudos filosóficos, o que o rigor das regras não pôde suportar. Mais tarde, já padre, teve de se sentar novamente na Universidade para fazer "cursos de aperfeiçoamento", dos quais não precisava realmente, e que não lhe deram o grau de mestre, mas apenas um certificado. Humildemente, Noël dispensou-os por enquanto.
Continuará a frequentar o Seminário Maior, que hoje alberga o Museu e a Biblioteca Municipal. Foi em 1767, aos trinta anos de idade, que recebeu a tonsura e o que se chamavam as quatro "ordens menores" (porteiro, acólito, leitor, exorcista), das quais apenas as de acólito e leitor foram mantidas até hoje. Recebeu o subdiaconado provavelmente em 1769, depois o diaconado e o sacerdócio em 1770 – ele tinha trinta e três anos de idade. Na sua primeira missa foi assistido pelo seu irmão mais velho, já padre, na presença da sua querida mãe, já sobrecarregada de provações, mas tão feliz naquele abençoado dia.
Nessa altura não faltavam sacerdotes, tanto assim que o “Reverendo Noël Pinot” esperou um ano para que um cargo ficasse disponível: a 21 de Janeiro de 1772, tornou-se vigário no arciprestado de La Flèche, uma data que infelizmente continuará a ser desastrosa para a França, onze anos mais tarde, quando o seu rei caiu sob o ódio dos revolucionários em 1793.
Esta humilde paróquia de Bousse passará mais tarde para a diocese de Le Mans. Uma vez que o seu Pároco morrerá em breve, o Reverendo Pinot assinará humildemente “pró-sacerdote” ou “servo”. Depois será nomeado na pequena paróquia de Coutures perto de Saumur, onde, como Vigário, será também nomeado como pároco professor na escola dos rapazes. Após dois anos, passou – ainda vigário – para Saint-Germain de Corzé, perto de Angers, durante cerca de cinco anos, onde obteve a benevolência total do seu pároco. Depois foi a capelania dos Incuráveis em Angers, a sua cidade natal.
Mal tinha regressado a Angers, junto do seu irmão mais velho que tinha acabado de ser nomeado capelão da catedral, quando a sua irmã e madrinha, bem como a sua querida e venerável mãe, morreram uma após a outra.
Do seu apostolado com estes pobres infelizes incuráveis, um dos seus colegas de seminário disse: “Este clérigo santo era conhecido pelos seus dons em toda a cidade que o tinha visto nascer”. Noël Pinot permanecerá mais de sete anos nesta posição. No início dedicou-se de corpo e alma, depois, quando adquiriu um certo hábito, pôde dedicar algum tempo à preparação para o seu famoso diploma de Mestre das Artes, que recebeu em 1788 – tinha quarenta anos de idade!
Muito pouco tempo depois foi nomeado para a paróquia de Louroux-Béconnais, dedicada ao santo bispo Aubin: este santo foi bispo de Angers no século V, depois de ter sido abade em Tintillant; lutou energicamente contra casamentos incestuosos; celebra-se a 1 de Março. Foi assim sob este patrocínio que Noël Pinot se estabeleceu no seu presbitério no dia da Santa Cruz, 14 de Setembro de 1788, precisamente num domingo esse ano.
Nessa altura, esta paróquia era a maior de Anjou, com os seus sete mil hectares, onde os camponeses pobres cultivavam apenas um pouco de centeio; havia lá muitos mendigos, que Noël tentou aliviar com todas as suas forças e com todos os seus meios. Como filho de um tecelão, tem roupas feitas, distribui-as, priva-se do essencial, de tal forma que o seu fiel servo tira alguns pedaços de tecido para lhe dar pelo menos o necessário.
Mestre Pinot tentou pacificar o seu rebanho contra as incursões muito frequentes dos gabelos nesta região: estes últimos eram implacáveis no seu trabalho, e os camponeses odiavam-nos; havia muitas raivas e ressentimentos! Mas o pároco fez um esforço especial para desenvolver a devoção ao Sagrado Coração e do Rosário.
Depois, os eventos se aceleram; convocam-se os estados gerais, as eleições dos representantes aquecem os espíritos. Em Agosto de 1789, o clero foi despojado dos seus bens; o mapa administrativo da França foi redesenhado; todos os nomes de lugares demasiado marcados pela herança feudal ou cristã foram modificados. Notar-se-á que a paróquia de Louroux não muda o seu nome, porque os legisladores desconhecem obviamente que este nome de localidade vem da palavra latina “oratorium”!
Pouco a pouco, as coisas vão ficando mais claras, e não no sentido da pacificação: Noël Pinot notou cada vez mais que a divisão estava a conquistar os seus confrades, sendo alguns deles a favor da aceitação da Constituição Civil do Clero, outros opondo-se firmemente a ela. No domingo, 23 de Janeiro de 1791, convocado pelo presidente da câmara para prestar juramento após a missa, recusou-se a fazê-lo vigorosamente, enquanto o seu vigário se deixava convencer.
No domingo, 27 de Fevereiro, no final da missa, subiu ao púlpito paramentado, com a sua alba e com a sua estola, e com doçura mas firmemente explicou a todos os seus paroquianos as razões firmes da sua recusa em transigir com a Constituição Civil do Clero; ele era agora um “refractário” de primeiro plano. Ele já ganhou os qualificativos insolentes de canalha, de fanático, de perturbador do descanso público, homem a temer, incendiário, degolador.
Prevendo a consequência lógica da sua atitude, propôs aos seus pequenos servidores de missa que se confessassem, pois “dias maus estão a chegar aqui”, e preparou em particular os mais maduros entre eles para fazer a sua Primeira Comunhão no dia seguinte, apesar de ter apenas nove anos de idade, uma idade precoce nessa altura para receber este Sacramento.
A partir de sábado, 5 de Março, vieram prendê-lo. Antes de mais, oferece hospitalidade, vida e alimentação a esta tropa, que aceita sem vergonha. No início da manhã, todos partem para Angers, onde Noël Pinot tem a honra de ser o primeiro padre preso durante este período sinistro.
Uma primeira sentença condena-o a ser afastado da sua paróquia durante dois anos. Mas enquanto esperava por um segundo julgamento, foi encerrado no castelo da Marechal d'Aubeterre em Beaupréau sequestrado para a ocasião, onde foi de facto tratado com os melhores sentimentos pelos proprietários e pelos habitantes; embora privado da Eucaristia e da Missa, desfrutava ali de alguns momentos de descanso e descontracção, muito necessários depois de tanto trabalho, e antes do seu julgamento final.
Chegamos à Primavera de 1791; o Papa Pio VI condena a Constituição Civil do Clero, o que dá grande satisfação a Noël Pinot, porque se vê reforçado na sua posição, enquanto alguns dos Confrades compreendem o seu erro e chegam à demissão. No local, um segundo julgamento confirma o primeiro e liberta Noël, proibindo-lhe ao mesmo tempo qualquer contacto com a sua paróquia: uma “liberdade condicional”, por assim dizer.
Aproveitando esta semiliberdade, Noël Pinot refugia-se aqui e ali, na esperança de poder retomar alguma actividade pastoral ao serviço das populações privadas de sacerdotes. Mas ele é rapidamente descoberto e perseguido. Em breve terá de abandonar a sua batina para usar roupas simples de camponês – mas manterá sempre, amarrado à volta dos seus rins, um cálice. Durante vinte meses ia de uma casa para outra, celebrando aqui, ensinando ali, confessando, ajudando da melhor forma possível todas as pessoas que queriam permanecer fiéis à Igreja e a Deus. Ele irá mesmo a lugares da diocese de La Rochelle!
Em 1792, quase trezentos sacerdotes da diocese, enganados por falsas promessas, foram de facto encarcerados e depois transportados para Nantes para serem exilados para Espanha. A “Guerra da Vendée” começa na região de Beaupréau, onde Noël Pinot está actualmente escondido. Repetindo a odisseia dos Macabeus, o exército cristão da Vendée conquista muitas localidades, reivindica os seus pastores legítimos: Noël Pinot regressa à sua paróquia de Louroux e até celebra lá uma missa solene – a última, porém, porque o exército da Vendée é derrotado antes de Nantes, e o Terror exercerá a sua terrível vingança: sacerdotes foram presos e executados, alguns guilhotinados em Angers, várias dezenas de outros afogados nas águas geladas do rio Loire. Noël Pinot esperou a sua vez, calmamente, enfrentando todos os perigos quando saiu do esconderijo, escapando por pouco a mil buscas... até ao dia desta suprema denúncia em Fevereiro de 1794, o trabalho de um antigo paroquiano que em tempos tinha ajudado generosamente.
Noël Pinot foi tratado não menos mal do que Nosso Senhor desde o momento da sua prisão: amarrado, até ao ponto de derramar sangue, insultado, caminhando em lugares lamacentos, levado a pé até Angers, espancado, ferido, privado de luz e comida, foi interrogado e condenado por um antigo confrade; foi mesmo este último que lhe propôs, por cinismo ou falsa compaixão, morrer vestindo das vestes sacerdotais confiscadas no momento da sua prisão, ao que Noël respondeu: “Sim, será para mim uma grande satisfação”.
O cortejo que o levou ao local de execução fez um desvio para que No¨rl sofresse mais insultos. Foi recolhido e calmo, como o seu divino Mestre, naquela sexta-feira, às três horas. A guilhotina foi instalada no próprio local do altar-mor da Igreja de São Pedro, que tinha sido completamente demolida há algum tempo.
Imolado nessa sexta-feira, 21 de Fevereiro de 1794, Noël Pinot foi atirado para a vala comum, tendo recebido ainda mais insultos dos homens encarregados da tarefa. Depois as autoridades procuraram e mataram todos os “suspeitos” que teriam ajudado Noël Pinot durante a sua “cabala”. Por sua vez, foram atirados para a vala comum, da qual todos os restos mortais foram transportados para outro lugar, misturando-os sem muito cuidado, de modo que era impossível encontrar o corpo sagrado do padre mártir.
A investigação para recolher todos os testemunhos possíveis progrediu bastante lentamente devido aos acontecimentos difíceis. Finalmente, a causa foi oficialmente aberta em 1905, confirmada em 1919 por Bento XV; em 1926, durante a primeira celebração da festa de Cristo Rei, Pio XI proclamou Beato o nosso Mártir.
(Traduzido do francês por Afonso Rocha)
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