segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Santa Líoba (ou Leoba), Abadessa – 28 de setembro


     A participação ativa das religiosas nas missões estrangeiras se desenvolveu tanto nos séculos XIX, XX e atual, que chegamos a considerá-la como uma inovação moderna. Mas tal, entretanto, não é verdadeiro, pois apesar de algumas diferenças de métodos, devidas ao aparecimento de congregações ativas sem clausura, o mesmo sistema de missões era praticado no início da evangelização dos bárbaros na Europa.
     Como exemplo, basta citar a solicitude missionária de São Bonifácio a qual corresponderam Santas Líoba, Tecla, Valburga e muitas outras que, deixando sua tranquila Abadia de Wimborne, na Inglaterra, transladaram-se para as terras selvagens dos pagãos alemães.
     Líoba pertencia a uma boa família de Wessex e sua mãe, Ebba, era aparentada com São Bonifácio. Embora a data de seu nascimento não seja conhecida, este é considerado um milagre. Os pais de Líoba eram muito religiosos e levavam uma vida santa e temente a Deus. Passados muitos anos sem ter filhos, pediam a Deus que lhe enviasse um filho para perpetuar sua descendência e, assim, mesmo na velhice, o bom Deus lhes presenteia com uma linda criança. Tinne e Ebba, seus caros pais, nunca se cansaram de rezar e pedir a Deus o cumprimento de um desejo que a muitos anos lhes era tão caro.
     Numa noite, sua mãe teve um sonho em relação ao nascimento da filha Líoba. Assim foi o seu sonho revelador: “Sonhara que trazia em seu seio um sino de igreja e no momento em que estendia a mão para tomá-lo, o sino emitia doces e melodiosos sons. Ebba chamou sua fiel ama e narrou-lhe o sonho; a velha escrava, tomada de espírito profético, disse-lhe: ‘Dareis à luz a uma filha, que deveis consagrar ao serviço de Deus’”. (Vida de Santa Líoba, 1914, p. 5). Assim, bem pequena foi consagrada e entregue aos cuidados da abadessa do Mosteiro de Wimborne, Santa Tetta. A criança fora batizada com o nome de Thruthgeba, logo modificado para Liobgetha (Leofgyth) e abreviado para Líoba (ou Leoba), que significa “a bem-amada”.
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     Interessante também foi o sonho que teve a própria Santa Líoba, que resumia toda a sua santa vida. Assim foi o seu sonho: “Parecia-lhe que um fio cor de fogo saia de sua boca; quanto mais se esforçava por tirá-lo, tanto mais e mais se prolongava, como se saísse do íntimo do seu coração. Tendo a mão cheia deste rico fio de seda, começou a enrolá-lo em forma de um novelo, que se tornava cada vez maior, até que cansada de enrolar, adormeceu, vencida pela fadiga e a ansiedade”. (Vida de Santa Líoba, 1914, p. 8). Este sonho ficara tão vivo em sua memória, pois sabia que Deus queria dizer-lhe algo através dele. E, realmente, neste, resumia sua vida inteira.
     Quando chegou a maioridade, Líoba decidiu permanecer no mosteiro, fez sua profissão religiosa e progrediu rapidamente na virtude e na sabedoria. Sua inocência servia de exemplo para as monjas mais velhas. Ela se deleitava nas leituras sacras e nas devoções.
     Em 722, São Bonifácio foi sagrado bispo pelo papa São Gregório Magno, que o enviou para pregar o Evangelho na Saxônia, na Turíngia e no Hesse. Quando as notícias de seu trabalho chegaram aos ouvidos das monjas de Wimborne, sua jovem parente, Líoba, se atreveu a escrever-lhe uma carta (conservada em arquivo). Nesta carta Líoba pede orações pela alma do pai, há oito anos falecido, por sua mãe, Ebba, que ainda vivia, e para si própria. Além disso, ela envia uma pequena poesia composta em latim. (*)
     São Bonifácio comoveu-se com sua carta e manteve uma longa correspondência com as monjas de Wimborne, até o ano de 748, quando escreveu para Santa Tetta pedindo-lhe que enviasse Líoba com outras companheiras para estabelecer um mosteiro e centros de religião para mulheres na nascente Igreja da Alemanha.
     A abadessa enviou umas 30 monjas, entre as quais as Santas Líoba, Tecla e Valburga. Todas se reuniram a São Bonifácio em Mainz, e Líoba foi colocada na direção da comunidade que se instalou em um mosteiro chamado Bischofsheim, isto é, “Casa do Bispo”, o que faz supor que São Bonifácio tenha cedido sua residência para as monjas.
     Sob a direção de Líoba o convento rapidamente atraiu mais vocações e dele saíram as monjas que ocupariam outras casas que a própria Líoba fundou na Alemanha, em Kitzingen e Ochsenfurt.
     Um monge de Fulda chamado Rodolfo, que escreveu a vida da Santa antes de transcorrerem sessenta anos de sua morte, relata que segundo o testemunho de quatro das monjas de seu convento, todas as casas religiosas naquela parte da Alemanha solicitavam uma monja de Bischofsheim para guiá-las.
     Segundo essa “Vida”, a beleza de Líoba era notável: tinha o rosto “como de um anjo”, sempre sereno e sorridente, embora raramente ela fosse vista rindo. Ninguém jamais a viu de mau humor, nem a ouviram dizer uma palavra dura; sua paciência e sua inteligência eram tão amplas quanto sua bondade.
     Diz-se que o copo em que ela bebia era o menor de todos, dado que nos permite afirmar que ela se entregava a jejuns e austeridades, em uma comunidade sujeita a Regra de São Bento, onde não se comia mais que duas vezes diárias.
     Todas as monjas faziam trabalhos manuais, e além dos afazeres domésticos na cozinha, refeitório, horta, recebiam uma educação intelectual: aprendiam latim e tinha uma sala destinada à escrita.
     Líoba não tolerava as penitências excessivas, como privar-se do sono, e insistia que todas descansassem ao meio-dia, como constava da Regra. Ela mesma se recostava naquele período, enquanto alguma das noviças lia para ela passagens das Escrituras; e se acreditando que a abadessa havia dormido a leitora se descuidava da tarefa, não passava um instante sem que Líoba abrisse os olhos e a boca para corrigi-la.
     A abadessa dedicava duas horas para conversas com qualquer das Irmãs que quisesse falar com ela. Todas essas atividades estavam à margem do dever principal: oração em comum, adoração de Deus e assistência aos sacerdotes que trabalhavam na missão junto com elas.
     A fama de Santa Líoba espalhou-se por toda parte; os vizinhos pediam a ajuda de suas orações quando o perigo de incêndio, as tempestades ou as doenças os ameaçavam, e os homens responsáveis pelos assuntos da Igreja e do Estado lhe pediam conselho.
     No ano de 754, São Bonifácio empreendeu uma viagem missionária à Frísia, onde sofreria o martírio, e recomendou Líoba a seu sucessor na sé episcopal, São Lull, e a todos seus monges de Fulda, pedindo que cuidassem dela com todo respeito e honra. Nessa ocasião, ele pediu também que fosse enterrado com ela, para que juntos eles aguardassem a ressurreição e permanecessem eternamente unidos no Senhor.
     Após o martírio de São Bonifácio, gozando de um privilégio especial, Líoba visitava frequentemente seu túmulo na Abadia de Fulda e assistia as cerimônias em sua honra.
     Depois de ter governado Bischofsheim por 28 anos, estando já bem idosa, Santa Líoba fez visitas de inspeção a todos os conventos que estavam sob seus cuidados, renunciou ao cargo de abadessa e foi residir em Schornsheim, a seis quilômetros de Mainz, numa propriedade dada a ela por Carlos Magno.
     Sua amiga, a Beata Hildegarda, esposa de Carlos Magno, insistentemente a convidou para a corte de Aachen; ela não pode deixar de ir, porém sua estadia foi breve. Ao despedir-se da rainha, disse: “Adeus, parte preciosa de minha alma! Cristo, nosso Criador e Redentor, queira dar-nos a graça de voltar a nos vermos, sem perigo de confundir os rostos, no claro dia do juízo final, porque nesta vida não voltaremos a nos ver”.
     Assim aconteceu, pois Santa Líoba morreu poucos dias depois de ter regressado, a 28 de setembro de 782, e foi sepultada na igreja da Abadia de Fulda, não no mesmo túmulo de São Bonifácio, porque as monjas temiam perturbar suas relíquias, mas junto dele, no lado norte do altar mor.
     Em 838, o abade de Fulda, Rabano Mauro, para proteger suas relíquias, transferiu-as para a Igreja Monte de São Pedro, e encarregou o monge Rodolfo de escrever a vida da Santa, estendendo seus relatos a quatro discípulas dela: Ágata, Tecla, Maria e Eoliba.
     Santa Líoba é mencionada no Martirológio Romano e sua festa se celebra em várias partes da Alemanha no dia 28 de setembro. 
(*) Ao Reverendíssimo Senhor Bispo Bonifácio,
     Líoba, a última das servas de Cristo, saúda Bonifácio, seu muito amado em Cristo, que se acha revestido da maior dignidade do Senhor, a quem está ligada pelos laços de parentesco.
     Rogo que vos digneis lembrar-vos de vossa amizade para com meu pai Tinne, habitante de Wessex, falecido a oito anos e para a alma de quem peço vossa intercessão junto a Deus. Recomendo-vos também minha Mãe Ebba que, como sabeis, vos está ligada pelos laços de parentesco. Sua vida passou-se no sofrimento; durante muito tempo prostrou-a o peso das enfermidades corporais. Sou sua única filha e desejaria que me fosse permitido, embora indigna, considerar-vos como um irmão, no qual confio mais do que em qualquer outro de meus parentes. Envio-vos este pequeno presente, não que seja digno de vosso agrado, mas a fim de que vos lembreis de minha humilde pessoa e que a distância não me apague completamente de vossa memória. Desejo também muito que esse presente estreite entre nós o laço de sincero afeto, para que perdure sempre.
     Suplico-vos, irmão bem-amado, ajudar-me com o escudo de vossas orações contra os assaltos de meu inimigo invisível. Peço-vos também que vos digneis corrigir esta carta tão mal redigida e não recuseis enviar-me algumas palavras, pelas quais ardentemente suspiro como prova de vosso fervor.
     Procurei compor os seguintes versos, segundo as regras da metrificação poética, embora tenha pouca confiança em meu talento e somente deseje exercitar minha veia poética, ainda muito fraca, o que prova que nisto também preciso de vossa direção. Aprendi esta arte com Eadburga, que nunca cessa de meditar sobre a santa Lei de Deus.
     Adeus! Vivei por muito tempo, sede feliz e rezai sempre por mim”.
(Seguem-se quatro linhas de versos em latim)
“Arbiter omnipotens, solus qui cuncta creavit,
In regno Patris semper qui lumine fulget,
Qua jugiter flagrans sic regnat gloria Christi,
Ilaesum servet semper te jure perenni”.
Fontes:

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