Este é dia solene para nós, convidados a contemplar a glória celeste e a alegria indefectível de Crispim de Viterbo, incluído pela Igreja entre o número dos Santos, entre aqueles que atingiram, depois da peregrinação terrena, a visão beatífica do Deus vivo, Pai, Filho e Espírito Santo, oferecendo-nos a animadora confirmação do que afirmou são Paulo: "Os sofrimentos do tempo presente não são comparáveis à glória futura que deverá ser revelada em nós" (Rom 8, 18).
Ao declarar Crispim de Viterbo santo, decretando que seja devotamente venerado como tal, em honra da Santíssima Trindade e para incremento da vida cristã, a Igreja assegura-nos que o humilde Religioso combateu o bom combate, conservou a fé e perseverou na caridade, conseguindo a coroa preparada para ele pelo Senhor. Verdadeiramente Frei Crispim, durante a vida terrena, esteve diante do Senhor, ao Seu serviço, e o Senhor é agora para sempre a sua herança feliz.
Para seguir a Cristo Jesus, renegou-se a si mesmo, isto é os ideais puramente humanos, e tomou a própria cruz, a tribulação quotidiana, os limites pessoais e alheios, só preocupado com imitar o Mestre divino, salvando assim em sentido perfeito e definitivo a própria vida. "Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro se, depois, perde a sua alma?" A interrogação evangélica, diz-nos respeito e convida-nos a fixar o olhar naquela meta feliz, que é já posse do nosso Santo e também para nós está reservada com absoluta certeza, na medida em que soubermos renegar-nos a nós mesmos e seguir o Senhor, levando o peso da nossa jornada de trabalhadores laboriosos.
E agora queremos refletir de modo particular sobre a mensagem de santidade de Frei Crispim de Viterbo.
Era o período do absolutismo de Estado, de lutas políticas, de novas ideologias filosóficas, de inquietações religiosas e de progressivo afastamento daquilo que são os conteúdos essenciais do cristianismo. A humanidade — no seu valoroso trabalho histórico, na busca incessante de mais altas metas de progresso e de bem-estar — é repetidamente tentada de falsa autonomia, de recusa das categorias evangélicas; por isso tem necessidade imprescindível de santos, isto é de modelos que exprimam concretamente, copiando do natural, a realidade da Transcendência, o valor da Revelação e da Redenção operada por Cristo.
Esta, por sinal, no autossuficiente século das luzes em que ele viveu, foi a missão de São Crispim de Viterbo, humilde frade capuchinho, cozinheiro, enfermeiro, hortelão, e depois por quase quarenta anos mendigo em Orvieto, ao serviço do seu convento. Ainda uma vez, pela misericórdia divina, as palavras proféticas de Jesus encontraram neste humilde Santo realização eloquente: "Bendigo-Te, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque isto foi do Teu agrado". Deus realiza maravilhas mediante a obra dos humildes, dos incultos e dos pobres, para que se reconheça que todo o progresso salvífico, mesmo terreno, corresponde a um desígnio do Seu amor.
O primeiro aspecto de santidade que desejo fazer notar em São Crispim é o da alegria. A sua afabilidade era conhecida a todos os Orvietanos e a quantos dele se aproximavam, e a paz de Deus, que ultrapassa toda a inteligência, guardava o seu coração e os seus pensamentos. Alegria franciscana a sua, mantida por um caráter rico de comunicação e aberto à poesia, mas sobretudo derivante de um grande amor para com o Senhor e de uma confiança invicta na Sua Providência. "Quem ama a Deus com pureza de coração — costumava dizer — vive feliz e depois morre contente".
Uma segunda atitude exemplar é certamente a da heroica disponibilidade para com os seus Irmãos, como também para com os pobres e os necessitados de todas as categorias. A este propósito, de fato, deve dizer-se que o esforço principal de Frei Crispim, enquanto humilde mente mendigava os meios de subsistência para a sua família conventual, foi o de dar a todos auxílio espiritual e material, tornando-se a expressão viva de caridade. É verdadeiramente incrível a obra por ele realizada no campo religioso e assistencial, pela paz, a justiça e a verdadeira prosperidade. Ninguém escapa à sua atenção, aos seus cuidados, ao seu bom coração, e ele vai ao encontro de todos, indo buscar aos mais inesperados recursos e também a intervenções, que se apresentam no enquadramento do extraordinário.
Outro particular cuidado da sua vida santa foi o de praticar uma catequese itinerante. Ele era um "leigo douto", que desenvolvia com os meios à sua disposição, o conhecimento da Doutrina Cristã, não deixando, ao mesmo tempo, de instruir os outros na verdade mesma. O tempo da mendicidade era o tempo da evangelização.
Animava para a fé e para a prática religiosa com uma linguagem simples, popularmente saborosa, feita de máximas e aforismos. A sua esclarecida catequese tornou-se bem depressa conhecida e atraiu personagens do ambiente eclesiástico e civil, ansiosas de aproveitar o seu conselho. Eis, por exemplo, uma sua iluminante e profunda síntese da vida cristã: "O poder de Deus cria-nos, a sabedoria governa-nos, a misericórdia salva-nos". As máximas transbordavam do seu coração, solícito de oferecer, com o pão que sustenta o corpo, o alimento que não perece: a luz da fé, a coragem da esperança e o fogo do amor.
Por fim, desejo sublinhar a sua terna e ao mesmo tempo vigorosa devoção a Maria Santíssima, que ele chamava a "minha Senhora Mãe" e sob cuja proteção levou a sua vida de cristão e de religioso. A intercessão da Mãe de Deus confiou Frei Crispim súplicas e preocupações humanas encontradas no decurso do caminho do seu mendigar e, quando era solicitado a orar por graves casos e situações, costumava dizer: "Deixa-me falar um pouco com a minha senhora Mãe e depois volta". Resposta simples, mas totalmente penetrada de sabedoria cristã, que demonstrava total confiança na solicitude maternal de Maria.
A vida oculta, humilde e obediente de São Crispim, rica de obras de caridade e de sabedoria inspiradora, traz uma mensagem para a humanidade de hoje que, do mesmo modo que a da primeira metade do século XVIII, espera a passagem confortante dos santos. Ele, autêntico filho de Francisco de Assis, oferece à nossa geração, muitas vezes inebriada pelos seus bons êxitos, uma lição de humilde e confiante adesão a Deus e aos seus desígnios de salvação; de amor à pobreza e aos pobres; de obediência à Igreja; de entrega a Maria, sinal grandioso de misericórdia divina mesmo no obscuro céu do nosso tempo, segundo a mensagem confortadora vinda do seu Coração Imaculado para a presente geração.
Elevemos a prece ao nosso Santo que obteve a alegria definitiva do Céu onde não existe "nem morte, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas já passaram".
Ó São Crispim, afasta de nós a tentação das coisas caducas e insuficientes, ensina-nos a compreender o verdadeiro valor da nossa peregrinação terrena, infunde-nos a necessária coragem para cumprir sempre» entre alegrias e dores, entre fadigas e esperanças, a vontade do Altíssimo.
Intercede pela Igreja e pela humanidade inteira, necessitada de amor, de justiça e de paz. Amém! Aleluia!
Papa João Paulo II – Homilia de Canonização –
20 de junho de 1982
Frei Crispim, irmão leigo capuchinho, nasceu em Viterbo (Itália) a 13 de Novembro de 1668, filho de Ubaldo Fioretti e Márcia Antoni. Com a morte do pai, o pequeno Pietro, este era o seu nome de batismo, e a piedosa mãe, viúva pela segunda vez, passam aos cuidados do tio materno Francisco. Pietro frequentou com proveito a escola primária junto dos Jesuítas e por estes foi admitido, depois, nas suas oficinas como sapateiro.
Mais tarde, o jovem Pietro, ao participar numa procissão realizada em Viterbo para implorar chuva em tempo de grave seca, impressiona-se com a piedade dos noviços capuchinhos e, tocado pela graça numa definitiva solução, a 22 de Julho de 1693 ingressou no convento de Palanzana para iniciar o noviciado na Ordem franciscana, tomando o nome de Crispim.
A sua vida como religioso transcorrerá por 57 anos totalmente consagrados ao serviço de Deus e dos irmãos, principalmente dos mais necessitados. Não era sacerdote, mas irmão leigo ocupando-se de simples trabalhos na sua comunidade.
Na cozinha, na enfermaria, no parlatório, no apostolado itinerante de catequese, no campo assistencial, o irmão Crispim, como autêntico filho de São Francisco, edifica todos com o exemplo e a dedicação, e a quantos o procuram, nobres e doutos, a começar do Papa Clemente XI, sabe dar a palavra e o conselho de quem vive a união com Deus, a verdadeira alegria cristã, a coragem evangélica, a pobreza e o solícito serviço do próximo.
Gravemente enfermo durante o inverno de 1747-48, foi trazido a Roma para tratamento mais cuidadoso, e dois anos depois veio a falecer a 19 de Maio.
Em 1806, Pio VII proclamou-o Beato.
Três circunstâncias tornam particularmente significativo o acontecimento da canonização do Beato Crispim neste ano: celebra-se o VIII centenário do nascimento de São Francisco; a realização, neste mês, de um dos mais importantes Capítulos da Ordem Franciscana dos Capuchinhos e a eleição do novo Ministro-Geral; foi a primeira canonização decretada por João Paulo II em quatro anos de pontificado.
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