domingo, 23 de dezembro de 2018

Beatas Maria Jula Ivanišević e 4 companheiras, mártires

     Num mundo em que a honra e a dignidade feminina são substituídas por uma liberdade que descamba para a libertinagem, estas cinco mártires da castidade, em pleno século XX, nos dão exemplo de qual é a verdadeira face da mulher católica.
     As “mártires do Drina” faziam parte da Congregação das Filhas do Amor Divino.*
    A Serva de Deus Madre Francisca Lechner, Fundadora da Congregação das Filhas do Amor Divino (fundada em Viena em 1868), recebeu do Arcebispo Josef Stadler o convite para a abertura de uma Comunidade de Religiosas em Sarajevo, Bósnia. Após os trâmites legais, a própria Madre Francisca e duas Irmãs partiram de Viena, Áustria, no dia 24 de abril de 1882, e chegaram a Sarajevo no dia 28 do mesmo mês.
     Em Sarajevo as Irmãs trabalhavam em escolas e acolhiam alunas internas e crianças órfãs. Rapidamente seu trabalho foi reconhecido e ganhou o prestígio da população. A missão das Filhas do Amor Divino foi se expandindo em Sarajevo e arredores, com o trabalho abnegado e generoso das Irmãs. Para atender a demanda da missão, foi necessário realizar novas fundações.
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     Assim, em 1911, em Pale, localidade distante cerca de 20 k de Sarajevo, abriram um convento, “Casa de Maria”. Inicialmente esta casa era destinada para o repouso das religiosas que trabalhavam no Instituto São José, em Sarajevo, e para a recuperação de doentes. Entretanto, a “Casa de Maria” foi recebendo credibilidade e se tornou famosa pelas obras de caridade exercidas em favor de todos os necessitados que batiam às suas portas. Pale era um corredor de muitos transeuntes, pessoas que iam e retornavam de Sarajevo. Nesta casa também eram acolhidas pessoas, sem fazer distinção de etnia, cultura, cor, religião, que vinham de diferentes lugares. Ali recebiam alimentação e, não raras vezes, lugar para um repouso restaurador de energias para então seguir a viagem.
     As culturas ocidental e oriental - e seus respectivos interesses políticos e econômicos - chocavam-se seguidas vezes. A 2ª Guerra Mundial foi particularmente trágica na Bósnia oriental. O Rio Drina estabelece o limite entre as duas partes que hoje divide a Bósnia da Sérvia. Houve um conflito acirrado entre os sérvios e a população muçulmana e católica da Bósnia oriental. Estes povos foram duplamente provados pelas tragédias: em primeiro lugar, porque um grande número de civis inocentes perdeu a vida; em segundo, porque os que sobreviveram ao massacre tiveram de abandonar o seu ambiente e foram forçados a fugir.
     Havia duas facções que entravam em atrito: os “četnik”, membros voluntários da tropa armada do Estado da Sérvia. É um grupo irregular com conotação terrorista contra os povos não Sérvios; os “uštasa”, croatas revolucionários da direita. Aqueles multiplicavam os ataques às populações civis católicas e muçulmanas. Os incêndios às vilas indefesas, as torturas mais desumanas e os assassinatos em massa, o corte das linhas de comunicação fazia parte da ordem do dia. Estes, apoiados pelas forças armadas de ocupação ítalo-germânica, instituíam, a exemplo deles, os campos de concentração onde perderam a vida dezenas de milhares de opositores ao regime, mas também civis inocentes.
     Neste ambiente conflituoso, as Irmãs viviam e doavam a sua vida em favor do próximo e experimentavam a dor do povo indefeso e inocente.
     As cinco Irmãs Filhas do Amor Divino que formavam a comunidade “Casa de Maria”, em Pale, eram:
           - Maria Jula Ivanišević, nasceu em Godinjak, Croácia, em 1893. Desde sua juventude manifestou a vontade de entrar no convento, se bem que teve que esperar por causa da enfermidade de sua mãe.  Ingressou no Instituto dedicado a responder às necessidades sociais da juventude feminina de seu tempo. Exemplar na obediência, realizou diversos serviços. Em 1883 foi enviada à Bósnia, onde permaneceu o resto de sua vida. Foi uma religiosa “segundo o Coração de Jesus”, modelo na oração e no sacrifício, modesta e humilde, com um amor ilimitado ao Senhor, à Congregação e ao próximo. Fundamentalmente se sentia grata à Providência por haver sido educada na fé católica e pelo dom da vocação religiosa.
     Foi enviada a Pale como superiora da comunidade, onde exercia seu apostolado empenhando-se no âmbito pastoral e caritativo. Com efeito, em seu convento, chamado o “hospital dos pobres”, acolhia os doentes, os convalescentes, pobres e fugitivos. Sua atividade generosa e gratuita era de domínio público entre os habitantes daquela região, composta especialmente por ortodoxos.
          - Berchmana Leidenix - seu nome de batismo era Karoline Anna Leidenix; nasceu em 28 de novembro de 1865 em Enzersdorf, vizinho de Viena, Áustria, sendo seus pais Michael e Josefa. Foi batizada dois dias depois na igreja paroquial de São Tomé, Apóstolo. Nasceu em seguida uma outra filha, Matilde (mais tarde religiosa, Irmã Bernarda, FDC), e uma terceira nasce morta. A família logo ficou sem o pai, o que deixou Josefa, a mãe, em uma difícil situação social. A Madre Francisca Lechner, acolheu as duas meninas no convento em 1878. Karoline tinha então 12 anos. 
     Durante os estudos sentiu-se chamada e decidiu se tornar membro daquela Congregação. Ingressou no noviciado em 1882 e recebeu o nome de Irmã Maria Berchmana Johanna. Emitiu os primeiros votos em 20 de agosto de 1883 e os perpétuos em 17 de agosto de 1892. Foi enviada à Bósnia, então país de missão, onde permaneceu a vida toda.
     Professora muito hábil e empenhada, trabalhou nas escolas da Congregação. Além de outras atividades, dava aulas de catecismo. Durante a 1°. Guerra Mundial, prestou serviço no hospital militar alemão de Višegrad, cuidando dos doentes e dos feridos. A administração do hospital expressou sua gratidão em carta de 1915.
     Em 1931, quando tinha mais de 60 anos, foi nomeada mestra de noviças em Sarajevo. Na sua atividade educativa procurava infundir o amor por Deus, pela Igreja e pelo próximo nos corações das noviças, conforme afirmam aquelas que educou.
     Irmã Berchmana era uma mulher de fé profunda. Continuamente se dirigia à capela, toda imersa na oração. Ela sofria de asma, mas suportava tudo com paciência, abandonada à vontade de Deus. Se distinguia particularmente pelo equilíbrio, pontualidade e disciplina, exigindo o mesmo das noviças. Dois meses antes da sua morte, falando com o Pe. Ksaver Meško, Irmã Berchmana assim sintetizou a sua vida: “Por duas coisas sou infinitamente grata a Deus: porque nasci e fui educada na fé católica e porque me tornei religiosa”.
     Foi assassinada no dia 23 de dezembro de 1941 em um bosque de Sjetlina na idade de 76 anos. 
          - Krizina Bojanc, eslovena, nascida em 1885, "silenciosa e diligente como uma abelha", entrou no convento com 36 anos, quando as condições da família o permitiram. Aos 56 anos de idade, ela tinha um olhar atento para ajudar e confortar suas coirmãs, porque ela era simples, mas "cheia de Deus, era como se estivesse sempre pensando em Deus".
          - Antonija Fabjan, nome de batismo Josefa, nasceu em 23 de janeiro de 1907 no vilarejo de Malo Lipje (vizinho a Žužemberk, na Eslovênia) terceira de cinco filhos da mãe Josefa e do pai Janez (que tinha outros 3 filhos da primeira esposa que morrera). Perdeu o pai quando tinha 4 anos, e a mãe faleceu quando ela tinha 11 anos. Josefa foi confiada aos cuidados de uma das tias.
     Ingressou no convento em 9 de abril de 1929 e se consagrou a Deus em 19 de março de 1932. Esteve primeiramente no convento de Betânia próximo de Sarajevo, depois foi para Antunovac na Ilidža, e de novo no convento Betânia. Fazia trabalhos agrícolas e cuidava dos animais. Tinha uma saúde muito frágil e por isso passou um tempo em Pale se convalescendo, para onde foi transferida em 16 de setembro de 1936 e onde permaneceu até sua morte.
     Na Casa de Maria atendia os doentes e recebia pobres e crianças com boa vontade. Fazia todo necessário: cozinha, lavanderia, jardim e capela. O servir era o seu grande dom e simplesmente reconhecia as necessidades dos outros. Tinha uma palavra boa para todos.
     Era notada pela obediência e pelo espírito juvenil. Irmã M. Wilibalda Markensteiner disse dela: “Esta era a nossa grande menina! De boa vontade rezava em silêncio na capela do convento. Depois da oração sabia dizer: ‘Rezei, mas não recebi’”. Irmã M. Ligorija Murn deu este testemunho: “Quando Irmã Antonija estava comigo em Betânia, me contou que sua tia dizia sempre: ‘A quem te faz mal, tu faças o bem!’, como fala a passagem do Evangelho. Fui sempre fiel a estas palavras”.
     Na manhã do dia 11 de dezembro de 1941, o dia em que seria presa com suas coirmãs, um cetnico disparou e quase a matou enquanto ela fugia para a Casa de Maria.
          - Bernadeta Banja de origem húngara, nascida na Croácia em 1912, de 29 anos, a mais jovem das cinco mártires; era a cozinheira da comunidade, mas tão pequena de estatura que tinha que subir em um banquinho para desempenhar sua função. Era de uma família devota e numerosa, que considerou sua vocação como uma bênção de Deus; alegre, ela escolheu ser "fiel no pouco", e fazia um grande trabalho sobre si mesma para melhorar seu caráter e ser mais prestativa e humilde.   


   Era perigoso viver em Pale. Diante das sugestões de abandonar o povo, as Irmãs que ali viviam decidiram permanecer no meio dele, para compartilhar sua sorte e continuar a testemunhar-lhes o Amor Divino. Como era de se esperar, em 11 de dezembro de 1941, os soldados da milícia “četnik” aprisionaram as Irmãs, saquearam e incendiaram o convento.
     Assim iniciou a via-sacra dessas cinco Irmãs. Elas foram obrigadas a marchar, durante 4 dias e 4 noites, pelos caminhos da montanha Romanija, na neve, sem veste adequada, com interrogatórios, ameaças e ofensas. Irmã Berchmana não podendo prosseguir a caminhada, foi levada a Sjetlina onde se recuperaria do cansaço. Conforme o combinado, ela deveria ser levada também para Goražde, a fim de se juntar ao grupo de suas coirmãs, o que não aconteceu. Ela foi morta no dia 23 de dezembro, no bosque de Sjetlina.
     As Irmãs tiveram de continuar a sua caminhada até Goražde, percorrendo cerca de 70 km. Ali chegaram na tarde de 15 de dezembro e foram levadas à caserna (2° andar do quartel), próxima ao Rio Drina. À noite, os “četnik”, completamente embriagados, invadiram o seu quarto com intenção de violentá-las, pediram que renunciassem à vida religiosa, em troca suas vidas seriam garantidas, teriam trabalho e graduação militar. Elas, porém, resistiram fortemente e declararam que estavam prontas a morrer antes de trair Deus e a própria consagração.
     Em defesa da dignidade e honrando o voto de castidade, Irmã Jula, Superiora da Comunidade, para evitar o estupro, abriu a janela e convidou as demais Irmãs a segui-la. Com a invocação “Jesus, salva-nos!”, lançou-se no vazio e as outras três fizeram o mesmo. Os soldados furiosos, sentindo-se derrotados, às pressas desceram as escadas até o local onde as Irmãs haviam caído e com muitíssimos golpes de faca mataram-nas. Depois, chutaram seus corpos até as margens do Rio Drina. Um soldado, também ferido por este grupo, viu como cada uma delas, antes de morrer, fez o sinal da cruz.
     Durante o processo canônico, fica evidente que as Irmãs foram mortas pelo fato de serem freiras católicas e por ter rejeitado o assédio dos soldados; foram consideradas mártires pelo ódio à fé e pela pureza.
     As Irmãs Jula, Berchmana, Krizina, Antonija e Bernadeta, conhecidas como as Mártires do Drina, verdadeiras missionárias na Bósnia sofrida, serviram a Deus e aos pobres com generosidade e amor desinteressado. Ao derramarem seu sangue, confirmaram a fidelidade a Deus. Estas zelosas religiosas foram elevadas à glória dos altares em 24 de setembro de 2011 como "mártires do Drina".
Fontes: Congregação das Filhas do Amor Divino; 
santiebeati/it

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