sexta-feira, 5 de abril de 2019

Santa Juliana de Mont-Cornillón ou Liège - 5 de abril


     No fim do século XIII surgiu em Liège, Bélgica, um movimento eucarístico cujo centro foi a Abadia de Cornillón, fundada em 1124 pelo Bispo Alberto de Liège. Este movimento deu origem a vários costumes eucarísticos, como, por exemplo, a Exposição e a Bênção com o Santíssimo Sacramento, o uso das campainhas durante a elevação na Missa e a festa de Corpus Christi. A diocese de Liège era, por assim dizer, um verdadeiro "cenáculo eucarístico". Antes de Juliana, insignes teólogos haviam ilustrado ali o valor supremo do Sacramento da Eucaristia e, sempre em Liège, havia grupos femininos generosamente dedicados ao culto eucarístico e à comunhão fervorosa. Guiadas por sacerdotes exemplares, tais mulheres moravam juntas, dedicando-se à oração e às obras de caridade.
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     Juliana nasceu entre 1191 e 1192 em Rettine, nas proximidades de Liège, na Bélgica. Órfã aos 5 anos de idade, junto com sua irmã Inês, foi confiada aos cuidados das religiosas agostinianas do convento-leprosário de Mont-Cornillón. Foi educada sobretudo por uma freira cujo nome era Sabedoria e que acompanhou seu amadurecimento espiritual, até que a própria Juliana recebeu o hábito religioso e se converteu, também ela, em cônega regular agostiniana.
     Aos 16 anos, Juliana teve uma primeira visão, que depois se repetiu muitas vezes em suas adorações eucarísticas. A visão apresentava a lua em seu pleno esplendor, com uma faixa escura que a atravessava diametralmente. Nosso Senhor a fez compreender o significado do que lhe aparecera: a lua simbolizava a vida da Igreja na terra; a linha opaca representava, no entanto, a ausência de uma festa litúrgica, para cuja instituição pedia a Juliana que trabalhasse de maneira eficaz, isto é, uma festa na qual os fiéis pudessem adorar a Eucaristia para aumentar sua fé, crescer na prática das virtudes e reparar as ofensas ao Santíssimo Sacramento.
     Juliana adquiriu uma notável cultura, chegando até a ler as obras dos Padres da Igreja em latim, particularmente Santo Agostinho e São Bernardo. Além de uma inteligência vivaz, Juliana mostrava, desde o começo, uma propensão particular à contemplação; tinha um sentido profundo da presença de Cristo, que experimentava vivendo de maneira particularmente intensa o Sacramento da Eucaristia e meditando com frequência sobre as palavras de Jesus: "Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos" (Mt 28,20).
     Entretanto, durante cerca de 20 anos Juliana conservou em segredo a revelação que havia enchido seu coração de alegria. Finalmente contou a duas fervorosas adoradoras da Eucaristia: a Beata Eva, que levava uma vida eremítica, e Isabel, que a havia seguido ao mosteiro de Mont-Cornillón. As três mulheres estabeleceram uma espécie de "aliança espiritual", com o propósito de glorificar o Santíssimo Sacramento. Também quiseram envolver um sacerdote muito estimado, João de Lausana, cônego da igreja de São Martinho de Liège, pedindo-lhe que interpelasse teólogos e eclesiásticos sobre o que elas carregavam no coração. As respostas foram positivas e motivadoras.
     O que aconteceu com Juliana de Cornillón se repete frequentemente na vida dos santos: para ter a confirmação de que uma inspiração vem de Deus, é necessário sempre submergir-se na oração, saber esperar com paciência, buscar a amizade, aproximar-se de outras almas boas e submeter tudo ao juízo dos pastores da Igreja. Foi precisamente o bispo de Liège, Roberto de Thourotte, quem, depois das dúvidas iniciais, acolheu a proposta de Juliana e das suas companheiras.  Convocou um sínodo em 1246 e ordenou a celebração da festa de Corpus Domini em sua diocese.
     Juliana já fizera preparar um Ofício em latim para a nova celebração. São Tomás de Aquino, então jovem clérigo, foi encarregado de compor o Ofício litúrgico da nova festividade, o que se realizou em 1232.
     A iniciativa era apoiada pelo douto dominicano Hugh, mais tarde cardeal legado dos Países Baixos, e por Joaquim Pantaléon, arcediago de Liège, de Troyes (França), eleito papa em 1261 com o nome de Urbano IV. Mais tarde, outros bispos estabeleceram a mesma festa nos territórios confiados aos seus cuidados pastorais.
     Juliana não veria a instituição da Festa de Corpus Christi pelo Papa Urbano IV para a Igreja toda em 1264. Priora do Mosteiro de Mont-Cornillón desde 1230, instaurara uma disciplina rigorosa que não agradava a todas. Juliana sofreu a dura oposição de alguns membros do clero e da própria superiora do seu mosteiro. Então, por vontade própria, ela deixou o convento de Mont-Cornillón com algumas companheiras, e durante 10 anos, entre 1248 e 1258, foi hóspede de vários mosteiros de religiosas cistercienses.
     Ela edificava todos com sua humildade, nunca tinha palavras de crítica ou de reprovação para seus adversários, senão que continuava difundindo com zelo o culto eucarístico. Faleceu em 5 de abril de 1258, em Fosses-La-Ville, na Bélgica. Na cela em que jazia, expuseram o Santíssimo Sacramento e, segundo as palavras do seu biógrafo, Juliana morreu contemplando, com um último transporte de amor, Jesus Eucaristia, a quem sempre havia amado, honrado e adorado. Ela soube antes de falecer que, além de Liège, também a Alemanha ocidental já festejara a festa de Corpus Domini em 1252.
     Seu corpo foi sepultado na Abadia Cisterciense de Villiers. É festejada pela Santa Igreja no dia 5 de abril.         
A Bula Transiturus
     Na bula intitulada Transiturus de hoc mundo (11 de agosto de 1264), o Papa Urbano também evoca com discrição as experiências místicas de Juliana, respaldando sua autenticidade, e escreve: "Ainda que a Eucaristia seja solenemente celebrada todos os dias, consideramos justo que, ao menos uma vez por ano, faça-se dela mais honrada e solene memória. As demais coisas, de fato, das quais fazemos memória, nós as apreendemos com o espírito e com a mente, mas não obtemos por isso sua presença real. No entanto, nesta comemoração sacramental de Cristo, ainda que sob outra forma, Jesus Cristo está presente conosco em sua própria substância. De fato, enquanto estava a ponto de ascender ao céu, disse:'Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos' (Mt 28, 20)".
     O próprio Pontífice quis dar exemplo, celebrando a solenidade do Corpus Domini em Orvieto, cidade em que então residia. Precisamente por ordem sua, na catedral da cidade se conservava - e se conserva ainda hoje - o célebre corporal com as marcas do milagre eucarístico ocorrido no ano anterior, em 1263, em Bolsena. Um sacerdote, enquanto consagrava o pão e o vinho, teve fortes dúvidas sobre a presença real do Corpo e do Sangue de Cristo no sacramento da Eucaristia. Milagrosamente, algumas gotas de sangue começaram a escorrer da Hóstia consagrada, confirmando, dessa forma, o que a nossa fé professa.
     Urbano IV pediu a um dos maiores teólogos da história, São Tomás de Aquino - que naquela época acompanhava o Papa e se encontrava em Orvieto - que compusesse os textos do ofício litúrgico desta grande festa. Tais textos, em uso ainda hoje na Igreja, são obras-primas nas quais se fundem teologia e poesia. São textos que fazem as cordas do coração vibrar, para expressar louvor e gratidão ao Santíssimo Sacramento, enquanto a inteligência, adentrando-se com estupor no mistério, reconhece na Eucaristia a presença viva e verdadeira de Jesus, do seu sacrifício de amor que nos reconcilia com o Pai e nos dá a salvação.
     Ainda que, após a morte de Urbano IV, a celebração da festa do Corpus Domini tenha se limitado a algumas regiões da França, da Alemanha, da Hungria e da Itália Setentrional, o Papa João XXII, em 1317, restaurou-a para toda a Igreja. Desde então, a festa teve um desenvolvimento maravilhoso e ainda é muito especial para o povo cristão.
     Recordando Santa Juliana de Cornillón, renovemos, também nós, a fé na presença real de Cristo na Eucaristia. Como nos ensina o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, "Jesus Cristo está presente na Eucaristia dum modo único e incomparável. De fato, está presente de modo verdadeiro, real, substancial: com o seu Corpo e o seu Sangue, com a sua Alma e a sua Divindade. Nela está presente em modo sacramental, isto é, sob as espécies eucarísticas do pão e do vinho, Cristo completo: Deus e homem" (Compêndio do Catecismo da Igreja Católica, 282).
     Com as palavras do hino eucarístico Adoro te devote, repitamos diante do Senhor, presente no Santíssimo Sacramento: "Fazei-me crer cada vez mais em vós, que em Vós eu tenha esperança, que eu vos ame!".
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