Mais uma vida bem curta, mas em linha recta para Deus, e incomparável como apaixonante modelo para rapazes, aos quais aconselhamos vivamente a leitura da sua bela biografia ('), da qual vamos dar aqui ligeiríssimo apontamento.
Nascido em Turim em 1901, filho do Director do jornal «La Stampa», que também foi embaixador de Roma em Berlim, e duma mãe admirável, que nele soube incutir o incondicional culto da verdade e formar-lhe a vontade numa educação viril, de montanhês de Bielle — nem doces, nem mimos; vinho só em dias de festa — realizou o mais completo tipo de autêntica virilidade, aquela que o mundo é incapaz de conceber: a virilidade que domina as paixões da adolescência e sabe sujeitar inteiramente a vida a uma vontade forte. Não se deixou viver; venceu a vida.
Não havia nele sombra de respeito humano, assim como era incapaz de trair a palavra dada, ou de faltar à verdade no mais insignificante ponto. Duma alegria «que nunca foi vista ofuscar-se», cheio de bom humor e de exuberância, gozou da máxima popularidade entre os companheiros, aos quais arrastava com o seu vozeirão estentórico. Quantos deles não foram influenciados pela lição do seu
comportamento de cristão íntegro! Era dotado, diz um seu íntimo, duma «caridade tão vivida e sentida, que o tornava o elemento de união, a pessoa por todos amada, sem excepção. E valendo-se deste privilégio para aliciar todos ao bem, tinha mais a rara habilidade de não o fazer notar».
Conseguia assim fazer notáveis conquistas, precisamente porque dele e apesar do seu desassombro, se pode dizer que o seu grande mérito consistiu em realizar todo o oposto do tipo clássico do beato.
Outra razão do seu prestígio entre rapazes residiu na superioridade da sua adaptação a todos os desportos, nos quais facilmente triunfou, fosse a bola, a natação, o remo, a bicicleta, a equitação, o automobilismo e, mais que tudo, o alpinismo, que foi a sua grande paixão e no qual quis iniciar tantos companheiros de estudos, aos quais solicitamente amparava nas suas primeiras excursões às montanhas.
Que alegria e que encanto não sabia ele imprimir-lhes! Como auxiliava e animava os seus colegas fatigados! E também como vigiava que não deixassem de cumprir os seus deveres religiosos!
Foi também sempre delicadíssimo e atencioso ao máximo com os humildes, aos quais igualmente cativava.
Enquanto os outros rapazes discutiam complicados sistemas filosóficos, Pedro Jorge, seguro na simplicidade do seu pensar, não inventava crises nem dores; sabia donde vinha e para onde ia.
Mas é preciso que percorramos, embora de fugida, a sua actividade vicentina, que tanto o absorveu, porque, conforme afirmava, ela fazia mais bem aos seus amigos vicentinos do que aos pobres. A um tipógrafo amigo, que se lhe queixava do desânimo de certos operários modernos, angustiados por grandes misérias morais, observava-lhe: «Olha, para se curarem, seria bom que fizessem a visita aos pobres. Se esses que assim se degradam tanto, vissem com os próprios olhos a miséria material, como nós a vemos todas as semanas, experimentariam desgosto da sua miséria moral, fruto da baixeza e vulgaridade a que não raro fazem descer o seu procedimento».
Foi aos 17 anos que Pedro Jorge entrou para a Conferência dos Padres Jesuítas no Instituto Social e dali passou, aos 21, para a do Círculo Universitário. Generoso nas dádivas, não regateava tão pouco o seu tempo, prestando-se a substituir os vicentinos impedidos: assim, visitava correntemente quatro e cinco famílias e assim também era dos mais assíduos à sessão da Conferência, de que foi Vice-Presidente e onde muitas vezes substituía o Secretário.
Era não só benfeitor, mas o amigo e irmão dos pobres que visitava, os quais acompanharam o seu funeral com verdadeira veneração, tocando o esquife e fazendo o sinal de cruz.
Fez entre os seus companheiros da Universidade a mais intensa campanha para propaganda da obra das Conferências, à qual deveu muito da sua formação e que não sacrificava, mesmo nas épocas de mais violento trabalho escolar: «morrer a tudo, excepto à Conferência de S. Vicente de Paulo», dizia ele! E era tão grande a sua dedicação pelos pobres, que evitava sair de Turim para a aldeia no Verão, a fim de não faltarem de todo os visitadores! Era também ele o único vicentino que não se preocupava com o estado da caixa: queria sempre atender a todas as misérias.
São inúmeros e edificantes os traços que até nós chegaram da sua zelosíssima vida vicentina, apesar do recato e modéstia da sua actuação. Lembremos apenas a narrativa simples, por ele feita, sobre a mudança de casa dum pobre: fora preciso procurar outra casa, esta apareceu e a mudança fez-se... Simplesmente faltou dizer como se fez: foi ele próprio, empurrando um carro de mão através das ruas de Turim, onde tão conhecido era. No carrinho, os desmantelados trastes, e pela mão, os cinco andrajosos filhinhos do pobre!
Já agonizante, na véspera da morte, a sessão da Conferência decorria sob um peso de tristeza; o Presidente perguntou pelos pobres de Pedro Jorge. Um vicentino apresentou então um bilhete do próprio punho deste, em que eram dadas as indicações precisas. A letra era quase ilegível, pois o corpo já estava invadido pela paralisia que iria acabar de o vitimar dentro de horas; mas atestava bem como o seu pensamento acompanhava a Conferência e os pobres até à morte. Esse bilhete, conservado como relíquia, ficou servindo de marcador no livro das actas da Conferência.
A doença atacara subitamente aquele organismo de ferro: fora em 30 de Junho de 1925, ao regressar do rio, onde fora remar, que sentira uma dor nos rins. Pedro Jorge gracejou, dizendo estar a precisar de se retemperar com o ar das montanhas; tinha, de facto, marcada uma ascensão a dois picos dos Alpes, para o dia 4 de Julho. Nesse mesmo dia fazia maior ascensão: subia ao Céu, onde piedosamente cremos que está a tomar parte na Conferência de que fala Ozanam, após tão bela vida e tão resignada agonia, com aceitação plenamente consciente do sofrimento e sacrifício da vida.
«Pedro Jorge, como a tua alma está bela»! «Jesus quer-te tanto!» — dizia-lhe o sacerdote que acabava de lhe ministrar os últimos sacramentos, e acrescentava: «Tinha um ar celeste».
Se foi grande o bem que dele irradiou em vida, maior se tornou ainda a sua influência nos meios juvenis para além da morte: foi preciso que o grão morresse para germinar.
«Pedro Jorge teria feito assim», pensam ainda hoje os rapazes, contagiados pelo seu luminoso exemplo. E assim, como diz o seu biógrafo, eterno no Céu, imortal também na terra, com a graça do seu auxílio e da sua intercessão.
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