Existe uma espiritualidade própria para os leigos? Ela é um tanto diferente da espiritualidade do clero e dos religiosos pela própria diferença de condições. Vejamos a história: A espiritualidade dos primeiros cristãos inspirava-se na vida dos apóstolos e na comunidade primitiva. Isto lemos nas orientações que S. Paulo dava para as comunidades sobre o novo modo de viver. Nos três primeiros séculos, os cristãos inspiravam-se no martírio. O mártir era o cristão por excelência, pois imitava Jesus a ponto de morrer como Ele. Com o surgimento dos monges, os fiéis viviam a espiritualidade dos monges em casa. Não era uma espiritualidade para leigos, mas para monges. Lembremos que havia heresias que negavam a matéria, o corpo e a vida no mundo. Para ser santo, tinha que sair do mundo onde viviam as pessoas. Na Idade Média, continuando a mesma mentalidade, os mosteiros passaram a ser o modelo de vida espiritual. Não se desenvolveu a espiritualidade leiga, matrimonial, como se dizia, no mundo. Prova disso é que os santos são todos padres, bispos e freiras. Nos séculos que se seguiram, a humanidade se desenvolveu, mas a espiritualidade não acompanhou. Quando se fala de leigo, não se quer dizer incompetente, mas simplesmente que não é padre ou religioso. Leigo não está em oposição nem é uma situação má. A gente do povo (leigo) pode ser tão santa ou até mais, como qualquer padre ou freira. O hábito, o altar ou a vocação, não são, por si só, critérios de santidade. A vida cristã pode ser vivida em qualquer circunstância: casado, solteiro, viúvo. Ela acontece também em situações que chamamos de más. Ela não depende da situação humana. Jesus é o primeiro a afirmar que os pecadores públicos e as prostitutas vos precederão no Reino de Deus porque acolheram a Palavra (Mt 21,31). Nenhum cristão é de segunda categoria. Milhões de seres humanos poderiam ser reconhecidos como santos. A Igreja não pode marginalizar ninguém e não lhe abrir os tesouros da santidade.
Jesus modelo do cristão
Jesus é o modelo do leigo. Ele era leigo. Não pertencia à classe sacerdotal. Participava da vida espiritual do povo judeu em suas leis e tradições. Procurava fazer o bem por onde passava. Essa lembrança ficou no coração dos apóstolos (At 10,38). Tinha o coração cheio do Pai e das pessoas. Jesus não foi padre nem frei, foi um Homem de Deus. Os religiosos e sacerdotes devem seguí-lo como os leigos, naquilo que lhes é especifico: o ministério e o modo como Jesus escolheu para viver, pois Jesus não era casado. Isso não é obrigatório. Sendo modelo, é Nele que vamos buscar inspiração. Há movimentos e espiritualidades que perderam o sabor do jeito de Jesus viver. Isso deseduca. O modelo é Jesus e não um tipo de espiritualidade de um momento.
Desafios de um novo modelo
Querer um modelo de espiritualidade próprio do leigo, não diz que a outra modalidade é ruim, mas não é própria para ele. Não podemos chegar ao ponto em que se chegou em certos tempos colocando o leigo como cristão de segunda classe. Não posso pretender, como padre, apresentar o modelo, mas vamos buscar juntos. Creio que, além do conhecimento de Jesus, temos que lembrar que o leigo vive no mundo. A espiritualidade deve se fazer também a partir do mundo. É ali que se santifica. Este não é oposição a Deus, mas é o Jardim que Deus deu ao homem para cultivar. Não precisamos sair do mundo para levá-lo a Deus. É preciso torná-lo aberto a Deus.
ARTIGO REDIGIDO E PUBLICADO
EM SETEMBRO DE 2009
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