A Palavra de Deus é um livro sagrado. Pelo modo com que o tratamos, pouco demonstramos que é sagrado. De fato, é sagrado quando nos põe em contato com quem o escreveu através de homens inspirados pelo Espírito Santo. Nós o acolhemos com satisfação e encontramos ali a luz para nosso caminho: “Vossa palavra é luz para meus pés, e luz para meu caminho” (Sl 119, 105). Um estudo diz o centro da Bíblia está no salmo 117,8 “Melhor é buscar refúgio no Senhor do que por no ser humano a esperança”. Confiamos nas pessoas, mas Ele é o Tudo. Nós O encontramos em sua Palavra. Não é suficiente abrir a Bíblia, como se fosse algo mágico que solucionasse como apertar de um botão. Deus assumiu nossa condição quando Se encarnou e quando nos disse suas palavras. Por isso é preciso usar os meios humanos para o conhecimento da Palavra. É certo que ela não está fechada ao humilde e iletrado. A Palavra tem infinitos sentidos, como diz o autor católico Orígenes, homem muito culto dos inícios da Igreja. Em primeiro lugar é preciso saber o sentido original do texto. Não basta abrir e ir citando. É necessário saber o gênero literário, se é um livro histórico ou sapiencial, se salmo ou profético, se é apocalíptico, se são cartas ou são evangelhos. Que recurso de linguagem usou? Se pegarmos um texto isolado podemos até provar que Deus não existe. Tem que ser visto o contexto e o tempo histórico, do contrário caímos nos fanatismos que destroem o sagrado e o humano. Foi escrito por pessoas da comunidade e discernido na comunidade como sagrado.
Sabedoria e ciência
Como em Jesus, o humano e o Divino vão juntos. Um não destrói o outro. Orientados pela “Palavra viva e eficaz... que julga as disposições e intenções do coração” (Hb 4,12ss), os fiéis, orientados por seus dirigentes, foram discernindo o que era de Deus e o que era só do homem. Não podemos nos desligar do passado. Por isso temos a Tradição da fé, tão importante quanto a Palavra, pois a explica. A Tradição também tem o Espírito Santo. A Bíblia tem uma história em sua composição: Foi primeiramente vivida, depois colocada por escrito, a seguir compilada como temos hoje. Foi a Tradição Apostólica que discerniu quais os escritos deveriam constar da lista. O Novo Testamento veio depois da comunidade já criada. Esta recolheu os ensinamentos de Jesus e os colocou por escrito dentro de um esquema próprio, de uma mentalidade e para o bem de uma comunidade. Os judeus só aceitaram os livros que foram escritos em hebraico e aramaico. Já os cristãos aceitaram os livros que foram escritos em grego, guiados pelo Espírito Santo. Assim também foram aceitos os livros do Novo Testamento. O critério era o que as comunidades usavam como Palavra de Deus, pois eram do tempo apostólico, usados nas celebrações e estavam de acordo com a fé. Havia outros livros deste tempo que não foram aceitos.
Reescrevendo a Bíblia
Não vamos reescrever a Bíblia como que outro livro como se não fosse suficiente para nosso tempo. O que faz a Palavra atual é continuar ouvindo o mesmo Espírito que a inspirou. Atual porque veio de Deus. Não aprisionamos a Palavra. Jesus já aconselha a ler os sinais dos tempos (Lc 21,29-31). À medida que vivermos estas palavras com abertura de coração seremos capazes de torná-la sempre nova. O modo de tornar a palavra viva não é repeti-la, mas vivê-la, procurando também como foi interpretada nos tempos passados. Assim podemos compreender que o bom escriba tira de seu tesouro coisas antigas e novas (Mt 13,52). É bom saber de cor, mas é preciso viver essas palavras com o coração.
ARTIGO PUBLICADO EM SETEMBRO DE 2014
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