segunda-feira, 16 de novembro de 2015

VENERÁVEL PADRE PELÁGIO SAUTER CSsR - A PRIMEIRA CARTA

Foi por volta de 1912, numa Quinta Feira Santa, apenas três anos após ter chegado ao Brasil. Pe. Pelágio ainda não falava bem a língua portuguesa. Residia no grande convento perto do ribeirão Cascavel, hoje Setor São José. Naqueles dias ele estava só com o Irmão Simão em casa, porque os outros padres estavam fora, nos trabalhos da Semana Santa.
Terminadas as celebrações da Semana, Pe. Pelágio enviou uma carta ao seu Superior na Alemanha. Vale a pena ler e reler. Para não perder o seu sabor original, vamos transcrever alguns trechos dessa carta, conservada em nossos arquivos:
“Revmo. Pe. Provincial! Vivam J.M.J.A.T. Já que hoje posso descansar um pouco dos trabalhos da Semana Santa, aproveito a oportunidade para lhe escrever. A Semana foi pesada para mim... Não obstante, sinto-me satisfeito. Eu havia realizado todas as cerimônias da Quinta Feira Santa, e preparado o sermão da Paixão para o dia seguinte, Sexta Feira Santa. Deitei-me e dormi cerca de meia hora, quando alguém tocou. Irmão Simão foi ver o que era: Um doente para sacramentar. Onde? Em Ribeirão, a 7 léguas de Campininhas. Quando ouvi essa noticia, fiquei aterrado. Eram mais de 11 horas da noite. Amanhã, Sexta Feira Santa, “missa dos pré-santificados”. Muita gente chegando, e eu sozinho em casa. Perguntei ainda: 
- A pessoa está muito doente? 
- Está para morrer. 
- Já se confessou este ano? 
- Não! 
- Há um ano? 
- Pode ser. 
Portanto, eu devia ir. Nossos animais (de montaria) estavam longe, no pasto.Para trazê-los, foi uma hora ou mais. Por sorte era lua cheia. Eu disse ao Irmão que estaria de volta lá pelas 11\12 horas do dia seguinte, para presidir as cerimônias da Sexta Feira Santa. Montei no cavalo do “portador” e saí. Eu, sozinho na estrada que conhecia, ou pensava que conhecia! Nunca me esquecerei desta noite que foi uma verdadeira noite da Paixão para mim também. Errei o caminho diversas vezes. Cerca das três horas da madrugada encontrei uma casa, guiado pelo cantar do galo, que me indicou o caminho. Finalmente às 8:30 estava na casa da enferma. A estas alturas já havia perdido a esperança de estar de volta ao meio dia, como tinha imaginado. Por isso tomei um pouco de café com pão. Atendi a enferma em confissão que, a meu ver, estava para morrer. Imediatamente peguei o caminho de volta, não sem trocar de animal, pois é raro um cavalo agüentar 15 horas de caminhada. Às 15:30 estava novamente em Campinas, mais morto que vivo. Uma hora depois, fiz a via sacra com muita gente e depois o sermão da Paixão”. 
Desabafos 
Descrevendo esta noite em que reviveu um pedaço da Paixão do Senhor, ele se desabafou na mesma carta: 
- "As viagens a cavalo são para mim muito cansativas, para não dizer, sobre-humanas... Nas nossas viagens pelo sertão somos obrigados a pernoitar em camas diferentes, semanas seguidas. O sono é sempre curto, porque as confissões se prolongam até meia noite. Às vezes, até 2 horas da madrugada... As casas são de tal qualidade, que nem sempre oferecem proteção contra as intempéries...Muitas vezes dormi na sela do cavalo, cavalgando, por não ter tido tempo de dormir à noite. "
Nestes poucos meses já tivemos seis mil ou mais comunhões em Campininhas. Eu já fiz mais de 40 pregações este ano, mas não faltou medo e tremedeira. Até a carta do Pe. Pelágio. É por assim dizer, o primeiro capítulo de uma epopéia que ele iria viver ao longo dos cinqüenta anos de vida missionária em nossa pátria que ficou sendo a sua também. É uma pequena amostra dos muitos sofrimentos e alegrias, frustrações e vitórias de um povo que tornou-se o seu povo, dos pobres e enfermos que se tornaram seus filhos preferidos.

PADRE CLÓVIS DE JESUS BOVO CSsR
Vice-Postulador da Causa
Venerável Padre Pelágio CSsR
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