quarta-feira, 17 de abril de 2019

Santa Catarina Tekakwitha, o Lírio dos Mohawks - 17 de abril

     O sangue dos mártires é semente de santos. Nove anos depois que os jesuítas Isaac Jogues e Jean de Lelande foram capturados por guerreiros iroqueses, uma menina nasceu perto do local de seu martírio, Auriesville, Nova York.
     No ano de 1655, uma jovem índia foi capturada durante uma invasão dos Iroqueses. Seu nome era Kahenta. Nascera Algonquin e fora convertida pelos padres jesuítas. Levada para o território dos Mohawks, ela se casou com um chefe Mohawk pagão, que a salvara das torturas e morte, destino de muitos cativos. A aldeia dos Mohawks ficava em Ossernenon, ao longo da margem sul do Rio Mohawk, próximo da atual Auriesville, Estado de Nova York.
     No mês de abril de 1656, nasceu a pequena Tekakwitha, “a que põe as coisas em ordem”, e tempos depois seu irmãozinho. Embora sua mãe fosse cristã, seu pai não permitia que ela batizasse seus filhos. Tekakwitha tinha mais ou menos quatro anos quando uma epidemia de varíola exterminou muitos habitantes da aldeia, entre eles seus pais e irmão. A pequena sobreviveu, mas a doença deixou marcas em seu rosto, sua visão foi afetada e sua saúde se ressentiria para sempre. Tendo ficado órfã, seu tio, o novo chefe da aldeia, a adotou.
CONTINUA EM MAIS INFORMAÇÕES
     Após a epidemia, a aldeia foi abandonada e os sobreviventes construíram um novo povoado chamado Caughnawaga, há umas cinco milhas de distância.
     Embora Tekakwitha não fosse batizada, ela era católica no fundo da alma. Ela sentia muita solidão, em parte devido à sua pouca visão e à sua aparência, mas também porque percebia o que tinha de errado na vida dos Mohawks. Eles mostravam-se ferozes na guerra e frequentemente cruéis na vitória. Praticavam o canibalismo e os costumes primitivos eram agravados pela prática de cultos demoníacos. Ela fugia das danças e orgias pagãs. As torturas brutais de prisioneiros era algo em que toda a aldeia participava com entusiasmo, mas Tekakwitha não podia ver os sofrimentos impingidos às vítimas e permanecia sozinha em sua tenda.
     Ela era uma criança doce e tímida, levava a vida normal de uma menina nativa e foi criada de acordo com os costumes dos Mohawks. Aqueles que a tinha conhecido quando criança disseram que “ela era habilidosa, especialmente ao fazer objetos como os outros nativos”. Ela trabalhava peles de porco-espinho e de alce, e fazia cintos de madeira e contas. Suas ocupações cotidianas eram descascar o milho, fazer o pão nativo, procurar água, carregar madeira e servir a comida.
Aldeia Mohawks nos anos 1600
     Os Iroqueses foram vencidos pelos Franceses quando ela tinha em torno de dez anos. Um tratado de paz foi assinado, que permitia aos padres jesuítas a ida às aldeias Mohawks. Segundo a lei da hospitalidade em vigor entre os índios, os viajantes deviam ser bem recebidos, apesar das hostilidades entre Franceses e Iroqueses.
     Ao chegar aos 17 anos de idade, segundo as tradições dos iroqueses, ela deveria se casar com algum guerreiro da tribo. Competia aos parentes a escolha do noivo, problema, aliás, fácil de resolver em se tratando da família de um cacique. Seus tios, frustrados por suas contínuas recusas ao casamento, decidem enganá-la. Uma noite, eles pedem que ela vista suas melhores roupas, pois receberiam convidados. Eles chegaram: era um jovem e sua família. Os tios fazem-no sentar-se ao lado de Tekakwitha e ordenam que ela sirva sopa ao rapaz. Logo ela percebeu a trama: se ela oferecesse a ele a tigela, isto significaria que ela aceitava o casamento. Ela atirou a sopa no fogo e correu para fora da tenda em lágrimas, escondendo-se na plantação de milho até que os convidados tivessem partido.
     No ano de 1670, a Missão de São Pedro foi estabelecida na aldeia Caughnawaga e uma capela foi construída em uma das tendas. Em 1674, o Padre James de Lamberville, jesuíta missionário, chegou a Caughnawaga para cuidar da Missão de São Pedro.
     Um dia, o Pe. de Lamberville, sabendo embora da hostilidade de seu tio, seguiu um forte impulso e foi visitá-la quando Tekakwitha estava confinada à maloca depois de ferir a perna. Ela nunca havia encontrado esse padre antes, mas quando ele perguntou se havia algo que ele pudesse fazer por ela, ela disse a ele que queria se tornar católica. Há muito ela se sentia atraída pela fé católica, talvez em parte por causa da influência de sua mãe, mas também por observar o comportamento de outros cristãos na aldeia. Ela estava muito preocupada que seu tio desaprovasse, mas quando o Pe. De Lamberville convidou-a a ir rezar na capela, foi o encorajamento de que ela precisava.
      Vendo a sinceridade da jovem, ele concordou em instruí-la. Depois de muita resistência, seu tio finalmente cedeu e deu seu consentimento para que ela se tornasse cristã, contanto que ela não tentasse deixar a aldeia indígena. No dia 5 de abril de 1676, domingo de Páscoa, com a idade de vinte anos, Tekakwitha foi batizada na pequena capela da Missão, recebendo o nome de Catarina (de Sta. Catarina de Siena). Foi uma cerimônia singela, como singela era a alma da recém-batizada. Contudo, o missionário jesuíta francês, emocionou-se: - "Foi o momento mais feliz de meu ministério", recordaria ele anos mais tarde.
     A família de Catarina não aceitou sua escolha e passou a tratá-la como uma escrava. Como ela não trabalhava aos domingos e dias santos, não recebia comida naqueles dias.  Ela se tornou objeto de crueldades por parte de seu povo. Quando ela ia para a capela ou para a fonte, as crianças atiravam lama e pedras nela.
     Apesar das hostilidades, ela humildemente continuou a servir suas tias e era fiel em acompanhar as orações e a missa. Mas quando seu cunhado retornou à vila no outono de 1677 para pedir que ela se juntasse a ele e à sua irmã da missão católica de Sault Saint-Louis (perto de Montreal) - uma jornada de “mais de 200 milhas através de bosques, rios e pântanos” - ela teve que tomar uma decisão. O Pe. De Lamberville a encorajou a aceitar o convite e Catarina conseguiu escapar da aldeia sem ser notada. Quando seu tio descobriu que ela havia fugido, carregou sua arma e saiu em perseguição. Felizmente, ela e seus companheiros conseguiram evitá-lo. Finalmente eles chegaram sãos e salvos na aldeia da Missão de São Francisco Xavier, em Sault St. Louis; Catarina corre para a capela para render graças a Deus.
    A vida em Sault (ou Kahnawake) continuou como em Caughnawaga, mas a vida espiritual dela girava em torno da Igreja. Catarina assistia a missa da madrugada todos os domingos e depois novamente às 8:00 da manhã. Entre as missas, ela permanecia na capela para rezar o seu rosário, que ela levava consigo para todo o lado. “Ela se confessava todos os sábados e se preparava batendo grandes galhos nos ombros como penitência, enquanto chorava por seus pecados. Nos dias de semana, ela assistia às orações matutinas e vespertinas e, depois de trabalhar com os outros durante o dia, ela voltava imediatamente à capela para continuar sua vigília de oração, às vezes permanecendo por várias horas diante do Santíssimo Sacramento. Apesar de dois meses apenas terem passado desde que ela chegara a Kahnawake, decidiram que estaria pronta para receber sua 1ª. Comunhão no dia de Natal, 1677”.
     Foi o dia mais feliz de sua vida. Ela tem então um lema: “Quem pode dizer-me o que mais agrada a Deus, para que eu o faça?” Embora não soubesse nem ler nem escrever, ela se dedica a ajudar os outros. Tem uma vida plena de oração, penitência, devotada a ensinar os mais jovens, a cuidar dos doentes e dos mais idosos.
     Era grande sua devoção a Mãe de Deus. Aprendeu rapidamente a Ladainha Lauretana de cor. Seu Rosário estava sempre à mão e Nossa Senhora era o seu modelo. Sempre discreta, recolhia-se por longos períodos na floresta, onde, junto a uma cruz que ela havia traçado na casca de uma árvore, ficava em oração, sem, entretanto, descuidar-se das funções religiosas, do serviço da comunidade e da família que a hospedava.
     Durante uma visita a Ville-Marie (hoje Montreal), Catarina encontrou pela primeira vez mulheres que eram celibatárias: as Irmãs Hospitaleiras de São José que eram enfermeiras no hospital. Aquela vocação foi uma revelação para ela, e ela e suas companheiras retornaram a Kahnawake, determinadas a fundar sua própria comunidade religiosa. Catarina revelou ao Padre Fremin sua ideia, mas ele descartou-a, sabendo que seria impossível naquele momento.
     A 25 de março de 1679, Catarina tornou-se Esposa de Cristo: após a Sagrada Comunhão ela fez voto de perpétua virgindade. Na mesma ocasião ela se ofereceu a Maria Ssma. como filha. A vida religiosa a atraia, mas os missionários negaram-lhe permissão, pois além de ela só ter três anos de conversão, consideravam sua delicada saúde. 
      Catarina e Maria Teresa (Tegaiaguenta) tornaram-se grandes amigas e nesse ano de 1679 obtêm permissão para começar um pequeno convento na Missão; ela havia expressado o desejo de fundar um convento só para moças indígenas,
     Como resultado de tribulações e austeridades, algum tempo depois de ter feito os votos ela caiu doente. Em breve está tão fraca, que não pode visitar a capela ou deixar o leito. Durante meses ela suportou grandes dores e febre contínua, mas nunca perdeu sua fé em Nosso Senhor Jesus Cristo e em Sua Mãe Ssma. Durante a Quaresma de 1680, alguém lhe perguntou o que ofereceria a Jesus. "Eu entreguei minha alma a Jesus no Santíssimo Sacramento, e meu corpo a Jesus na Cruz", confidenciou ela com candura. 
Antigo retrato de Catarina pintado
pelo Pe. Chauchetière entre 1682-1693
Após distribuir suas poucas posses aos pobres, ela se preparou para receber os últimos sacramentos. A aldeia inteira chorava essa inevitável perda.
     Na Quinta-feira da Semana Santa, dia 17 de abril de 1680, por volta das quinze horas, ela expirou pronunciando com grande dificuldade e dor: “Jesus, Maria, eu Vos amo!”
     O Pe. Pierre Cholenec, um dos presentes no instante de sua morte, conta que, “no momento de sua morte, a face de Catarina, tão desfigurada em vida, quinze minutos após seu falecimento subitamente mudou e em instantes tornou-se tão bela, que assim que eu vi isto (eu estava rezando ao seu lado) eu dei um grito, fiquei tão aturdido, e mandei chamar o padre que estava atendendo as cerimônias da Quinta-feira Santa. Ao tomar conhecimento deste prodígio, ele acorreu com algumas pessoas que estavam com ele. Nós pudemos contemplar aquela maravilha até o momento de seu funeral. Eu admito francamente que meu primeiro pensamento, na ocasião, fora que Catarina podia ter entrado no Céu naquele instante e que ela tinha recebido – como por antecipação – em seu corpo virginal uma pequena indicação da glória que sua alma já teria possuído no Paraíso”.
      Contrariando os costumes indígenas, ela foi enterrada em um caixão e seus preciosos restos mortais puderam ser facilmente preservados.
     A devoção por Catarina começou imediatamente. Antes de sua morte ela prometera, tal qual Santa Teresa de Lisieux, que se lembraria dos seus amigos da Terra e que os ajudaria do Céu. Ela logo cumpriu sua promessa: curas aconteciam quando ela era invocada ou quando se usava sua relíquia.
     Catarina foi beatificada por João Paulo II em junho de 1980, foi a primeira americana nativa declarada bem-aventurada. Em 21 de outubro de 2012 foi canonizada pelo Papa Bento XVI.
     Santuários dedicados a Santa Catarina Tekakwitha foram erigidos em São Francisco Xavier, Caughnawaga, em Auriesville e em muitos outros lugares. Milhares de fiéis peregrinam a esses locais até nossos dias.

     Cinquenta anos após a morte de Catarina, o primeiro convento de freiras nativas foi estabelecido no México e elas rezavam diariamente pela canonização de Catarina Tekakwitha, o que finalmente aconteceu.

Nenhum comentário:

Postar um comentário