Nasceu em Sancey-le-Long, na diocese de Besançon, em 1765, sendo a quinta filha de uma família de pobres trabalhadores, que viria a contar nove. De saúde muito frágil, exactamente como a mãe, cresceu num ambiente sem sol, onde o pai, encarnação do dever, e a mãe, modelo de virtude, parecem não ter rodeado a pequenina duma afeição muito terna: o lar, de facto, era governado pela «tia Odette», irmã de João Francisco Thouret, retido muitas vezes fora de casa pela direcção duma fábrica de curtumes.
Joana Antide frequentou pouco a escola e cedo foi empregada como pastora. A solidão favoreceu-lhe o gosto pela prece, o desejo do céu e o desprezo do mundo. A volta dos campos, o principal cuidado de Joana era consolar e tratar a mãe, que os rudes servos abandonavam, embora ela se encontrasse em grande fraqueza. Em 1781, a morte de Joana Cláudia Labbe, esposa de João Francisco, constituiu Joana Antide senhora da casa: doze ou catorze pessoas para alimentar, o trabalho para distribuir e vigiar, até os vestuários para tecer. Tudo somava pesada fadiga; mas a jovem pôs nisso tanta valentia, sabedoria prática e generosa piedade, que bem merece passar por modelo «especialmente adaptado à nossa condição presente» (Pio XI).
A exactidão e a ordem, a busca da nota alegre ou agradável, a economia e a arte de tirar partido de tudo, foram, desde então, as características da sua administração doméstica. O resultado foi melhoria no passadio, ao mesmo tempo que o restauro da habitação. Joana Antide — e a tia Odette não acabava de o compreender! — encontrava até com que dar esmolas, e tempo para se entregar a demoradas orações. A sua prudência convidava-a, por outro lado, a poupar-se. Não a viam exceder as forças: com febre, enervada, bastava-lhe que, governando, ela pudesse ter quem lhe fizesse o que tinha de ser feito.
Ora foi do demónio que Deus se serviu para revelar à rapariga a sua vocação à vida religiosa. Uma criada viciosa queria arrastar Joana para o pecado: ela resistiu-lhe e, por escrúpulo, de nada falou ao pai, mas a desavergonhada veio a ser despedida; Joana sentiu acentuar-se nela o horror do mundo, e desde esse momento fez a Deus voto secreto da sua virgindade. Ao mesmo tempo, sentia a beleza duma vida toda consagrada ao serviço divino. Mas a madrinha, de quem ela recebera o nome próprio, pessoa que sempre se mostrara conselheira prudente, fez que ela se demorasse um pouco: «És demasiado jovem, e a tua pobreza vai embargar-te a vocação». Um terceiro motivo estava nas obrigações familiares; mas o terreno varreu-se por si mesmo: dois dos irmãos mais velhos alistaram-se no exército que o rei andava a recrutar para socorrer a América (e Joaninha conseguiu que eles recorressem à confissão e à comunhão, antes da partida); por outro lado, a tia Odette, já mais sensata, poderia retomar a direcção da casa. Criava-se mais liberdade.
O pároco de Sancey ocupou-se em iniciar Joana nos trabalhos paroquiais: não só a fez sacristão mas utilizou o dom que ela tinha de atrair as crianças; fê-la catequista. Ora, nesta data de 1785, um santo sacerdote, o venerável Receveur, pregou algumas missões nas vizinhanças de Sancey e dirigiu retiros fechados em que tomaram parte companheiras de Joana. Voltando estas jovens com desejos de vida mais perfeita, o pároco aconselhou-lhes que se aproximassem de Joana e procurassem imitá-la: comunicou-lhes ela o seu horror por todo o mal e o seu zelo pela religião. Mais tarde, algumas segui-la-iam para o claustro. Mas em Julho de 1787, por fim, depois de hesitar entre as carmelitas e uma ordem que se ocupava dos pobres, depois de muitas lutas com os seus, Joana Antide seguiu para o hospital de Langres, em que as Irmãs da Caridade haveriam de acolhê-la para lhe provarem a vocação. Foi à tarde da festa de Todos os Santos que, ao cabo de três meses de postulantado, ela chegou a Paris, ao convento fundado por S. Vicente de Paulo e por Santa Luísa de Marillac em 1641. Foi ela uma noviça perfeita; embora a rouparia — onde a empregaram — fosse dirigida por uma religiosa severa, exigente. Mas a grande prova originou-se numa doença; o couro cabeludo cobriu-se de pústulas e tratou-se de a despedir. Felizmente, uma irmã enfermeira triunfou, onde muitas outras tinham encalhado. Pôde dar-se a tomada de hábito em 1788.
Joana foi enviada para o hospital da Santa Rainha, onde o ar borgonhês lhe fez bem; e depois para Langres, depois para Sceaux, donde pediu para se ir embora... porque um fidalgo queria casar com ela!
A Revolução não poupou as Irmãs da Caridade. Em 1793, estando a Sociedade dissolvida, Joana Antide teve de, a pé e pedindo esmola, voltar para Besançon, onde a recolheu a irmã duma das suas companheiras de Paris. Depois, como para reparar o escândalo que dava seu irmão Joaquim, chefe local dos partidários da Convenção, voltou ela à sua aldeia, onde abriu uma escola gratuita, ensinou com zelo o catecismo e tratou dos doentes. Ofereceu esconderijo a padres católicos e facilitou-lhes o exercício do ministério sagrado, apesar das ameaças de represálias. A sua caridade de enfermeira permitiu-lhe repetidamente escapar às perseguições que lhe vinham do seu zelo em favor do ensino religioso.
Uma paz relativa em 1795 (o pároco legítimo pudera regressar a Sancey-le-Long) permitiu a Joana retomar a vida religiosa na Suíça, na sociedade do Retiro cristão; mas esta fundação do Padre Receveur foi para a Santa unicamente ocasião de vários meses movimentados, e Joana deixou-a. Perto da fronteira francesa, em Landeron, em 1797, encontrou ela os padres de Besançon, que lhe confiaram dirigir escolas religiosas nesta diocese. O Golpe de estado do «Fructidor» obrigou-a a deixar, por algum tempo, Sancey, onde retomara a escola; mas, pouco depois, tomaram a chamá-la os revolucionários, a quem ela respondera altivamente: «Não recebo nenhum salário em nome da lei, vós não podeis exigir e, seja como for, não obtereis de mim, em nome da lei, qualquer juramento de fidelidade».
Em 1799, instalou-se a irmã Joana Antide em Besançon, onde lhe confiaram uma escola e, quando vieram ajudá-la quatro raparigas, instalou um dispensário e uma sopa popular. A 15 de Outubro de 1800, o Vigário Geral presidiu à instalação do novo noviciado e, em 1801, encarregava a «Madre Thouret» de redigir uma regra, para a qual ela se inspirasse nos usos que seguira em Paris. O hábito compreendia: um vestido cinzento, um avental preto, um véu também preto e uma larga gola branca.
Em 1802, o governador de Besançon confiou às novas Irmãs da Caridade — que tinham escolhido como padroeiro S. Vicente de Paulo — a casa de prisão de Bellevaux: nesta diminuíram as despesas, embora melhorando o passadio dos detidos; este bom resultado deu-lhes o nome e mereceu-lhes o sustento financeiro do Império. A abundância das vocações permitiu casas novas, sobretudo no «Comté». A mãe de Napoleão abriu-lhes o acesso ao reino de Nápoles: Murat confiou-lhes o enorme e esplêndido convento-hospital de Regina Coeli. A madre Thouret cuidou de aumentar o raio de acção das suas filhas, que viera acompanhar a Nápoles. Antes de voltar à França, depois de oito anos de residência na Itália do Sul, obteve do papa Pio VII a aprovação da sua regra. As modificações, porém, que Roma nelas introduziu, provocaram a hostilidade invencível do novo arcebispo de Besançon, que proibiu à Santa reaparecer na sua diocese e exerceu tal pressão sobre as primeiras companheiras da fundadora, que elas recusaram-se a recebê-la. Unicamente ficaram fiéis à mãe as comunidades da Sabóia e da Itália. Sangrando-lhe o coração, Joana Antide retomou o caminho de Nápoles e foi lá que morreu a 24 de Agosto de 1826. Repousa o seu corpo na igreja de Regina Coeli. Beatificada em 1926, foi canonizada a 14 de Janeiro de 1934. Em 1947 eram estes os dados: 7.000 religiosas dependiam do ramo napolitano, cuja casa generalícia está em Roma. As irmãs de Besançon, repartidas por 160 casas, eram mais de 1.000.
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