Filipe II de Espanha governava quase metade do mundo, no dia 2 de Março de 1585, quando nascia em Ribera del Fresno, perto de Badajoz – Espanha, João Macias, batizado na igreja do povo nesse mesmo dia do seu nascimento. Não tem ainda cinco anos quando perde o pai e pouco tempo depois a mãe, ficando órfão com uma irmã menor que ele. Serão os seus padrinhos de batismo que cuidarão dele e o ajudarão a crescer.
A vida na Estremadura espanhola não era fácil e João não nasceu numa família abastada, pelo que desde muito jovem se viu entregue da responsabilidade de conduzir os rebanhos pelos campos e velar para que os animais voltassem seguros para casa. Era uma vida dura, mas ao mesmo tempo uma vida de solidão que lhe permitia o silêncio propício à contemplação de Deus na natureza. Já perto do final da vida confidenciará ao frei Gonçalo Garcia, seu confessor, que foi nesta idade, quando guardava os rebanhos do seu amo, que se encontrou com um menino da sua idade, que se dizia São João Evangelista. A aparição tinha como objetivo mostrar-lhe a proteção divina, mas também a revelação do que seria a sua vida e a missão a que Deus o chamava.
Depois de crescer e se formar como homem a guardar os rebanhos na solidão do campo estremenho, com vinte anos de idade, João deixa a sua terra natal para partir à conquista de novas oportunidades. Durante catorze anos e até embarcar em Sevilha rumo ao novo mundo das Américas, João vagueia e trabalha pela Andaluzia, conhecendo em Jerez de la Frontera o convento de São Domingos e os padres que nele vivem.
Já em Lima, no Peru, em 1620, será à porta do convento de São Domingos que irá bater no momento de necessidade. As referências de Jerez seriam certamente um bom cartão de visitas e uma boa recomendação para qualquer ajuda. Recebe-o o frei Martinho, o porteiro mestiço, que vai dando já que falar por causa do seu comportamento extravagante de caridade. Entre os dois nascerá uma amizade fortíssima e um sentimento de partilha do mesmo caminho de santidade.
Martinho de Porres encaminha-o para a Recoleta de Santa Maria Madalena, uma recente fundação na cidade, na qual depois de um processo de discernimento da vontade de Deus e dos homens, porque eles também têm uma palavra a dizer, João Macias é recebido a 23 de Janeiro de 1622 como irmão converso. Pela falta de instrução nas letras ficará na portaria, servindo os irmãos e a missão da Ordem, através do acolhimento de todos os que baterem à porta.
Mas a vida de João Macias não se reduz a um caráter prático, laboral, pela experiência vivida no campo ele sabe que necessita do silêncio e da solidão e por isso a cada oportunidade se refugia no claustro dos “naranjos” para se dedicar à oração e contemplação. Modelo para todos nós que buscamos o equilíbrio entre o trabalho e a contemplação, é necessário dar tempo a uma realidade e a outra, equilibrá-las como os pratos de uma balança.
É deste silêncio e desta intimidade com Deus que João Macias vai retirar as forças para ajudar todos aqueles que recorrem às portas de um convento num momento de necessidade. À semelhança do que acontece com frei Martinho de Porres, os pobres procuram João Macias para que os possa ajudar, para que lhes possa dar alguma coisa para comer ou vestir. Deus nunca permitirá que João deixe partir alguém sem a ajuda que procurava. E, mesmo quando não o procuravam, era ele que ia ao seu encontro, ao encontro das suas necessidades.
Ao final da tarde do dia 17 de Setembro de 1645, depois de uma vida dedicada ao silêncio, à oração e à caridade para com todos, frei João Macias entregava a sua alma ao Criador. Na sua cela, os irmãos vestidos de hábito branco e capa negra cantavam a Salve Rainha e, enquanto se ouvia o verso “Advogada nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei”, João Macias expirava confiante dessa misericórdia de Deus que havia pedido no momento da sua profissão, e que tinha procurado viver através da caridade e solidariedade para com todos.
Celebramos hoje a sua Memória, uma memória que por vezes se nos faz distante, pois sobre a sua vida passaram já mais de trezentos e cinquenta anos. Contudo, num momento em que procuramos encontrar o equilíbrio entre o ativismo das nossas realidades sociais e profissionais e a necessidade da contemplação do mistério de Deus, São João Macias pode nos ajudar, mostrando-nos como em qualquer lugar, e em qualquer homem, se pode encontrar o silêncio e a presença de Deus. Só necessitamos estarmos disponíveis, ser como porteiros que acolhem quem bate à porta.
Publicada por Frei José Carlos Lopes Almeida, OP
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