quarta-feira, 7 de outubro de 2020

REFLETINDO A PALAVRA - “Corpo entre a fragilidade e a beleza”

PADRE LUIZ CARLOS DE OLIVEIRA
REDENTORISTA
52 ANOS CONSAGRADO
45 ANOS SACERDOTE

Falando em ressurreição de Jesus, sempre sobra um dedinho de prosa para tocar num assunto meio escabroso: nosso corpo. Digo escabroso porque não se enfrenta com entusiasmo o tema. Nosso corpo, ou melhor, eu que sou corpo, é animado por uma alma imortal, criada por Deus em meu nascimento e destinada a viver eternamente unida a este corpo. Numa das esquinas da vida aparece tal de morte, seguida de perto por uma ressurreição que já deu provas de dar certo. Falar do corpo é muito gostoso, pois quem não gosta de seu corpo? Mesmo não sendo modelo, o que é relativo a determinadas tendências e tempos, nosso corpo sempre é belo, frágil, mas com uma semente de incorruptibilidade que nem as malhas da morte conseguem destruir. Esta incorruptibilidade já se realizou em Jesus e Maria. Em nós, ainda terrenos, temos ainda que esperar um pouco. Este corpo já foi vítima de muita má-interpretação. A própria Igreja, de acordo com as culturas que atravessou, sempre teve rusgas quanto a este tal “burrinho” ser domesticado, como diziam os antigos ascetas. Platão já o considerava uma prisão para a alma. Outros, inclusive santos, consideraram objeto do pecado, colocando o prazer como permitido somente para continuar a espécie. Não se exclui o exercício físico e espiritual do corpo para que se cumpra melhor sua finalidade: ser uma expressão clara e bonita do carinho com que Deus o criou. Deus o fez na fragilidade. A Escritura chama isso de barro. Mas o fez belo e bom, pois diz no Gênesis: “e Deus viu quer era muito bom tudo que criara”, inclusive a pessoa humana, macho e fêmea – Adam e Eva. A questão do pecado: não é o corpo que peca nem é instrumento do pecado. Tudo o que somos e temos é bom e santo. É a opção pessoal de cada um que usa o corpo fora do amor que ele merece: ser meio de amar o próximo no serviço que edifica e ser lugar onde se edifica a santidade. Nesta realidade ‘corpo’ entramos naquilo que o faz vivaz e expressivo de nosso interior: as paixões. Sabe quantas são as paixões? Amor, ódio, aversão, alegria, tristeza, audácia, esperança, desespero, cólera. Paixões são boas, desde que orientadas. Vivemos estas realidades entre sentimentos, emoções, desejos, afetos, inteligência e vontade. Este corpo envolto na sexualidade dialogal edifica um mundo cheio de amor e afeto. O que chamamos de pecado é exatamente acolher esta maravilha não como um dom, mas com o egoísmo de uma satisfação pessoal. Por mais que a vida, as condições humanas e os desvios que aparecem no decorrer da vida destruam a visão da finalidade de nosso corpo, ele permanece meio de santidade. É nele que nos santificamos, deixamos os desvios e somos para o mundo o que foi Jesus: fez-se carne e habitou entre nós para dar ao nosso corpo a dignidade de ser templo de Deus e ser participante da natureza divina.
ARTIGO PUBLICADO EM 30/04/2002

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