domingo, 1 de dezembro de 2019

Da. Maria Amélia de Bragança, a Princesa Flor


     Há 188 anos, nascia em Paris, em 1º de dezembro de 1831, Da. Maria Amélia a única filha de D. Pedro, o Duque de Bragança, e de sua segunda esposa, Da. Amélia de Beauharnais. Seu pai havia sido o primeiro Imperador do Brasil, como Pedro I, e 29º rei de Portugal, como Pedro IV - trono do qual abdicara apenas dois meses após sua aclamação, em favor de sua filha mais velha, Da. Maria II. Entretanto, dois anos depois, sua posição foi usurpada por seu tio (irmão mais novo de Pedro), que assumiu o trono como D. Miguel I. Ansioso para recuperar a coroa de sua filha, Pedro abdicou do trono brasileiro em abril de 1831 (em favor de seu filho mais novo, D. Pedro II) e partiu para a Europa com sua esposa, que estava grávida de Maria Amélia
     Pela via paterna, Maria Amélia era membro do ramo brasileiro da Casa de Bragança, sendo neta do rei D. João VI e da Infanta Carlota Joaquina da Espanha. Pelo lado materno, era neta do príncipe Eugênio de Beauharnais, enteado do imperador Napoleão I da França, e da princesa Augusta da Baviera, filha mais velha do rei Maximiliano I José da Baviera.
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     A fim de reconhecer os direitos de Maria Amélia como princesa brasileira, D. Pedro convidou várias pessoas para testemunhar seu nascimento, entre eles o embaixador brasileiro na França. A recém-nascida teve como padrinhos o rei Luís Filipe I de França e sua esposa, Maria Amélia das Duas Sicílias. D. Pedro ficou encantado com o bebê e enviou uma carta, datada de 4 de dezembro, aos seus outros filhos que haviam ficado no Brasil, incluindo o pequeno D. Pedro II, com a mensagem: "A Divina Providência quis diminuir a tristeza que sente meu coração paterno pela separação de V.M.I. [Vossa Majestade Imperial] dando-me mais uma filha e, à V.M.I., mais uma irmã e súdita ...".
          Quando a Princesa Dona Maria Amélia tinha apenas vinte dias de idade, seu pai partiu para os Açores, onde liderou as tropas liberais contra o usurpador Rei Dom Miguel (1802-1866), seu irmão mais novo. Sua Alteza permaneceu em Paris, vivendo com sua mãe e sua irmã mais velha, a Rainha de Portugal. Com a notícia da vitória do Duque de Bragança, as três insignes damas partiram para Lisboa, lá chegando em 22 de setembro de 1833.
     Charles Napier, um oficial naval britânico que lutou ao lado de D. Pedro, escreveu sobre o emocionante encontro: "Nunca o vi [Pedro] tão feliz e satisfeito. Ele embarcou um pouco acima de Belém e foi recebido na escada pela imperatriz [Amélia] que abraçou-o e beijou-o com o maior carinho: a rainha [Maria II] estava muito emocionada e não conseguiu segurar as lágrimas. A princesinha [Maria] Amélia, sua filha mais nova, teve boa parte de sua atenção: ela ficou um pouco assustada com sua barba espessa e não correspondeu muito às suas carícias".
     A família se estabeleceu no Palácio Real de Queluz, próximo a Lisboa. Contudo, a longa Guerra contra o usurpador Rei Dom Miguel minou a saúde do Duque de Bragança, que veio a falecer, vítima de tuberculose, na madrugada do dia 24 de setembro de 1834. Aos três anos de idade incompletos, a Princesa Dona Maria Amélia foi levada ao leito de morte de seu pai, que a abençoou, antes de entregar sua alma a Deus Nosso Criador.
     A Duquesa de Bragança jamais se casou novamente, e foi viver, com sua filha, no Palácio das Janelas Verdes, em Lisboa, onde passou a se dedicar à educação de Maria Amélia. No Brasil, a Regência (1831-1840) não quis reconhecê-las como membros da Família Imperial, situação que só mudou após a Declaração da Maioridade do Imperador Dom Pedro II, que fez questão de reconhecer sua madrasta (a qual chamava de mãe) e irmã mais nova como parte da Família Imperial e destiná-las uma pensão.
     Da. Maria Amélia tornou-se "uma jovem de beleza impressionante e inteligência cultivada", segundo o historiador H. Montgomery Hyde. Foi descrita como muito religiosa, inteligente e astuta, com uma personalidade e um pouco irônica. A princesa recebeu uma educação refinada, sendo muito hábil em desenho, pintura e ao piano. Além de gostar de poesia, Maria Amélia também era fluente em português, francês e alemão. Sobre ela, uma de suas professoras disse: "tem, sem saber, um talento excepcional para a dialética, uma habilidade que faria a fortuna de um jovem estudante de direito".
     Aparentemente, uma das principais motivações para sua dedicação aos estudos era seu pai. O duque de Bragança muito representou em sua vida e era sempre lembrado pela jovem princesa, que perguntava frequentemente aos seus interlocutores: "e meu pai, que me olha do céu, estaria satisfeito com sua filha?" Maria Amélia nunca foi capaz de lidar com a morte de seu pai e isto a tocava profundamente. Uma carta escrita pela princesa em 27 de agosto de 1851 fala sobre seus sentimentos:
Desenho de autoria da princesa
     Estive no [Palácio Real de] Queluz... Após a morte de meu pai, nunca havia visto este palácio novamente. Não conseguia lembrar-me de nada, absolutamente nada, com exceção do quarto onde meu pai morreu!... Lá lembrei-me de tudo. Cada objeto foi gravado em minha memória, mesmo tendo, naquela ocasião, três anos de idade! Foi com grande emoção que entrei naquele quarto!... A cama... a cama ainda é a mesma, no mesmo local, com as mesmas cortinas, as mesmas colchas, os mesmos travesseiros... tudo tão bem preservado... Ai...
     O jardim é bonito; foi-me mostrado um laranjal, plantado no mesmo ano da morte de meu pai, e por sua ordem, e um plátano plantado por ele... Uma profunda tristeza invadiu-me ao contemplar estas árvores que tinham sobrevivido a meu pai e que, provavelmente, sobreviverão a todos nós. É uma imagem da fragilidade humana. O homem é o mais frágil de todos os seres; ele morre, enquanto os objetos aparentemente criados para seu uso, suportam a séculos!... Mas estou divagando em minhas reflexões melancólicas...
Maria Amélia
     No início de 1852, o arquiduque Maximiliano da Áustria, então servindo na marinha austríaca, visitou Amélia e Maria Amélia durante uma escala em Portugal. A princesa já o conhecia de uma reunião familiar em Munique, em 1838. Sofia da Baviera, mãe de Maximiliano, era meia-irmã de Augusta Amália, a avó materna de Maria Amélia, e ambas pertenciam à alemã Casa de Wittelsbach. O arquiduque também era primo dos meio-irmãos de Maria Amélia, visto que seu pai, o arquiduque Francisco Carlos, era irmão mais novo da imperatriz Da. Leopoldina. Eles apaixonaram-se imediatamente e ficaram noivos. O noivado, no entanto, nunca foi oficializado, devido à morte prematura de Maria Amélia.
     Em fevereiro de 1852, Maria Amélia contraiu escarlatina. Com o passar dos meses, ela não se recuperou, sendo afetada por uma persistente tosse - os sintomas da tuberculose. Em 26 de agosto, a princesa deixou o Palácio das Janelas Verdes, onde morava, e viajou para a Ilha da Madeira. O clima da ilha tinha a reputação de salutar nestes casos, como Maria Amélia observou: "as febres desaparecem, dizem eles, como que por magia!" Ao despedir-se da família, a princesa Amélia pode ter sentido um mau agouro, pois disse à sobrinha: "Não é verdade, Maria, que você não vai me esquecer?"
     Maria Amélia, acompanhada de sua mãe, desembarcou em 31 de agosto no Funchal, a capital da Madeira. A cidade inteira as saudou com alegria e uma multidão acompanhou a princesa até seu novo lar. Ela adorou a ilha e disse à mãe: "Se eu um dia recuperar a minha saúde, vamos ficar muito tempo nesta ilha, vamos fazer longas excursões nas montanhas, vamos encontrar novas trilhas, como só fizemos em Stein". Mas sua saúde só piorou e, no final de novembro, toda a esperança se foi. No início de 1853, a princesa estava acamada e sabia que a morte estava se aproximando: "A minha força diminui dia a dia; eu posso sentir isso... estamos chegando ao começo do fim!" Um pouco depois da meia-noite, na madrugada de 4 de fevereiro, um padre administrou-lhe os últimos sacramentos. Maria Amélia tentou consolar sua mãe: "Não chore ... deixe que a vontade de Deus seja feita; que Ele possa vir em meu auxílio em minha última hora; que Ele possa consolar minha pobre mãe!" Ela morreu pouco depois, por volta das 4 horas da manhã. Tinha apenas 21 anos de idade.
      O corpo da princesa permaneceu em uma capela ao lado da casa onde ela morreu, até ser levado de volta ao continente, 7 de maio de 1853. Em 12 de maio, o caixão foi desembarcado em Lisboa, seguindo-se um grandioso funeral. Seus restos mortais foram enterrados ao lado dos de seu pai no Panteão dos Bragança, no Mosteiro de São Vicente de Fora. Quase 130 anos depois, em 1982, o corpo de Maria Amélia foi trasladado para o Brasil, sendo definitivamente sepultado na cripta do Convento de Santo Antônio, no Rio de Janeiro, junto a outros membros da família imperial brasileira.
     A morte de Maria Amélia tocou profundamente a todos que a cercavam. D. Pedro II jamais conheceu pessoalmente sua irmã mais nova, mas havia desenvolvido uma forte relação com ela através de suas cartas. Ele escreveu em seu diário, sete anos após sua morte: "Ouvi a missa para minha mana Amélia, com quem estava tão próximo e sinto-me tão triste por nunca a ter conhecido". Da. Amélia visitou o túmulo de sua filha a cada 4 de fevereiro até sua própria morte, em 1873. A imperatriz-viúva financiou a construção de um hospital no Funchal chamado "Princesa Dona Maria Amélia", em honra da filha. O hospital ainda existe. Ela também legou suas propriedades na Baviera ao arquiduque Maximiliano, "a quem [ela] ficaria feliz em ter como genro, se Deus tivesse conservado sua amada filha Maria Amélia".
     Durante muito tempo o arquiduque Maximiliano foi assombrado pelas memórias de sua noiva. Após seu casamento com Carlota da Bélgica, ele fez uma peregrinação pessoal, em 1859, aos locais ligados à Maria Amélia.
A  imperatriz viúva tendo 
ao lado o retrato da filha

Carta de Da. Maria Amélia ao seu irmão D. Pedro II

Funchal, 9 de janeiro de 1853
Meu querido mano Pedro,
     Aproveito um momento em que me acho com mais forças, para escrever-te, dando-te os bons anos.
     Desejo-te bem do fundo do meu coração toda a sorte de felicidade, e peço ao mesmo tempo a Deus, que me dê saúde, para nós nos podermos ver um dia, o que é um desejo bem grande que tenho!
     Agradeço-te pela mesma ocasião a tua excelente carta de 12 de novembro, a que não me tem sido possível responder mais cedo, mas que nem por isso deixou de me dar um grande prazer.
     Tenho passado mais incomodada estes últimos tempos, meu querido mano, sentindo-me muito fraca e abatida, o que fez, que estive há agora quase 6 semanas, quase sempre de cama, exceto poucas horas em que estou deitada num canapé. Graças a Deus, ao menos posso às vezes ocupar pouco, desenho, ou leio, mas nunca o posso fazer por muito tempo, pois cansa-me tudo.
     Acabo esta, dando-te um abraço bem apertado como tua mana muito amiga!
Maria Amélia
Fontes: A Princesa Flor D. Maria Amélia, D. Carlos Tasso de Saxe-Coburgo-Bragança.

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