Com o auxílio das
filosofias, chegamos ao reconhecimento do indivíduo, seu valor, sua singularidade
e sua grandeza como ser racional. Essas riquezas se contrapõem à criação do individualismo
que é dependente da raiz de pecado. Este individualismo, nascido do egoísmo
narcisista, tornou-se um sistema de vida na sociedade. ‘Cada um por si e Deus
por todos’, diz o provérbio. Penetrou os setores da vida social gerando a
desenfreada concorrência e a luta por ter mais bens e mais poder. É o que vemos
no chamado progresso. Ele privilegia poucos quando muitos ficam fora do
processo. Esse modo de pensar pragmatista invadiu também o pensar e o viver o
aspecto religioso. Temos uma espiritualidade individualista sintetizada nas
palavras: “Salva tua alma!”. É necessário salvar a alma, sim, mas em um corpo
espiritual. Até dizemos: Eu sou único diante de Deus, único responsável por
meus atos e ninguém tem a ver com isso, nem se meta. A espiritualidade passou a
ser acúmulo de bens espirituais, graças, virtudes, dons e méritos, como se
dissesse: eu consegui e você não. Não é essa mentalidade de Jesus que nos
coloca em relação uns com os outros dentro de um corpo espiritual que chamamos
Corpo Místico de Cristo. Os bens espirituais são para todo o corpo, como a
vitamina serve para todos os membros. O mal que fazemos prejudica o corpo, como
um membro doente. S. Paulo desenvolve bem essa realidade cristã. Quando era
menino eu ouvia dizer: “A oração que você faz aqui, o bem que faz, pode levar
uma pessoa a Deus lá no meio das florestas africanas”. O bem que faço é para o
bem comum. É a comunhão dos santos. A comunidade primitiva dizia que tudo se
tornava comum: “Tinham um só coração e uma só alma... tudo era comum entre eles”(At 4,32). É o último
desejo de Jesus: “Que sejam um como nós” (Jo 17,11). Como as células estão unidas para
a vida, assim os cristãos estão unidos para a Vida.
982. Tudo pelo espiritual
A vida espiritual
não são os momentos especiais que dedico à oração, mas de uma Vida que penetra
todos os aspectos da vida. Não há ato que a pessoa faça que esteja fora de
Deus. Não se trata de um panteísmo que diz que tudo é Deus, mas de um ser em
Deus. Paulo cita três autores pagãos, Epimenes de Creta, Cleanto e Arato (Sec. III AC): Na
divindade temos a vida, o movimento e o ser, pois somos de sua raça nele nos
movemos e somos (At
17,28). Tudo o que fazemos tem o lado espiritual e está unido aos outros
pois é o mesmo Deus que age em todos, mesmo que não creia. O aspecto espiritual
une nossas ações ao Deus que dá a vida, o movimento e o ser. Deste modo a
própria vida é o caminho para a santidade.
983. Um bem que seja bom
Levamos
bem nossa vida espiritual, nossas caridades, nossas orações. Mas o fazemos
isoladamente. A superação do egoísmo espiritual é pensar que o que faço de bem
seja bom para todos. Isso nos levará a vivermos melhor com as pessoas, pois
dependemos uns dos outros para ir a Deus. Quando rezo, rezo com todos e por
todos. Quando faço o bem, beneficio a todos. Se crescer espiritualmente, todo o
Corpo de Cristo cresce comigo. Por isso não tem sentido o ódio, o isolamento, a
divisão das pessoas. Reconhecemos o bem que cada um faz e procuramos cortar as
arestas que prejudicam a unidade. Damos o testemunho da verdade que cremos, mas
no amor. O amor é o sinal que estamos em Deus. Todos são irmãos, filhos do
mesmo Pai. Usar a religião contra o amor é negar a Deus.
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